Recentemente, tive uma experiência pessoal no hospital durante o início concreto da minha paternidade. Havíamos escolhido uma pediatra para o acompanhamento ambulatorial, mas optamos por outra profissional para o cuidado da sala de parto até a alta hospitalar do bebê, principalmente pela promessa de disponibilidade.

Disponibilidade faz muito bem para a satisfação e experiência do paciente e familiares no ambiente hospitalar, sendo possível a troca de familiaridade por disponibilidade:

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Além disso, não tínhamos familiaridade prévia com pediatra por se tratar inclusive do primeiro filho. Por fim, a possibilidade de experimentar uma suposta equipe de hospitalistas pediátricos me fez abraçar a escolha sem hesitação.

É importante destacar que fomos muito bem assistidos pelos pediatras no hospital, e os recomendaria tranquilamente. No entanto, gostaria de fazer alguns comentários baseados no meu conhecimento sobre o modelo hospitalista:

Percebi aos poucos que os pediatras se organizavam no hospital mais pela conveniência deles próprios do que pelos avanços sobre sobre otimização da qualidade assistencial e segurança do paciente, presentes na literatura. Não se trata de uma crítica pessoal, pois o sistema costuma ser desenhado para promover justamente esse tipo de postura. Os pediatras foram brilhantes dentro da lógica impregnada no nosso meio. Mas o mesmo grupo de “pediatras hospitalares” tinha uma estrutura ambulatorial até muito próxima do local da pediatra que escolhemos para o acompanhamento após a alta, com consultórios relativamente distantes do hospital em que estávamos.

Na verdade, atuavam no modelo tradicional – tanto no ambulatório quanto no hospital – e, para organizar melhor suas próprias vidas, faziam uma escala com um pediatra diferente do grupo a cada dia no hospital. Com isso, tivemos três dias no hospital e fomos assistidos por três pediatras diferentes. Nossa oportunidade de conversar com o pediatra era, a priori, a cada 24hrs.

Sinceramente, não gostei disso. Enfrentamos um quadro de icterícia fisiológica do recém-nascido, que, ao final, não teve maior importância. Mas, em um cenário onde não parecia necessário realizar exames sanguíneos diários, como o médico poderia melhor reconhecer, sem a observação clínica do dia anterior, se “o amarelão” estava estável, piorando ou melhorando? Ao final, perguntavam aos pais.

David O. Meltzer, da Univerdade de Chigago – quem tive o prazer de conhecer pessoalmente, no encontro anual da Society of Hospital Medicine, há alguns anos – é bastante conhecido por seus estudos sobre a importância da continuidade do cuidado na assistência hospitalar e resume esta questão mais ou menos assim:

A continuidade do cuidado, na qual preferencialmente o mesmo médico acompanha o paciente ao longo de sua internação hospitalar, é crucial para melhorar os resultados de saúde. Ele defende que essa prática permite um melhor entendimento do histórico e da evolução do paciente, reduz a fragmentação do cuidado e melhora a comunicação entre os outros profissionais de saúde e o paciente. Como consequência, apresenta três fatores:

  • Melhores resultados: pesquisas de Meltzer sugerem que a continuidade do cuidado pode levar a uma redução nas readmissões hospitalares, melhor adesão ao tratamento e maior satisfação do paciente. Ele aponta que médicos que conhecem bem seus pacientes estão em melhor posição para tomar decisões informadas e personalizadas;
  • Eficiência e custo: Meltzer também destaca que a continuidade do cuidado pode ser mais eficiente e economicamente vantajosa. Ao reduzir a duplicação de exames e procedimentos desnecessários, pode-se diminuir os custos hospitalares. Além disso, a melhora nos desfechos clínicos pode levar a menos complicações e, consequentemente, menos despesas com tratamentos de emergência.
  • Modelos de assistência: Meltzer inclusive estuda atualmente um modelo em que o clínico volta a ter atuação dentro e fora do hospital. No entanto, diferente da experiência que vivenciei, é organizado para garantir horizontalidade no cuidado hospitalar. 

Como muitas vezes apresentei em slides sobre o modelo hospitalista: “continuidade NAS equipes é tão importante quanto continuidade DAS equipes”.