O sistema de saúde brasileiro, historicamente guiado pelo modelo fee for service (pagamento por serviço), enfrenta desafios de sustentabilidade e qualidade assistencial.
Como alternativa, os modelos de remuneração por desfecho clínico ganham força ao substituir o pagamento por volume pelo valor entregue ao paciente, medido pelos resultados alcançados.
Apesar do avanço global da Saúde Baseada em Valor, sua adoção no Brasil ainda é limitada: apenas cerca de 10% dos hospitais possuem contratos realmente baseados em valor. Esse cenário reforça a urgência de uma mudança estrutural.
Para impulsionar essa transição, a ANS vem publicando guias e diretrizes que orientam a implementação desses modelos.
Embora exijam transformação organizacional, os pagamentos por desfecho trazem benefícios claros: melhor alinhamento de incentivos, compartilhamento de riscos e maior sustentabilidade hospitalar.
Tipos de modelos de pagamento baseados em valor
A remuneração baseada em valor não se resume a um único formato. Existem diversos modelos de pagamento que podem ser aplicados de forma isolada ou combinada, essenciais na transição para o Value-Based Healthcare (VBHC).
Pagamentos por Pacote (Bundled Payments)
Também conhecidos como bundles ou pagamentos empacotados, este modelo estabelece um valor fixo e pré-negociado para a jornada completa do paciente em um episódio específico de cuidado (ex: cirurgia de joelho, tratamento de parto).
O pagamento cobre todos os serviços essenciais (hospitalização, honorários médicos, medicamentos, reabilitação) dentro de um período definido.
O prestador assume o risco de custos acima do pacote, mas se beneficia da eficiência operacional em saúde e da redução de custos com qualidade se entregar o desfecho clínico esperado.
Pagamento por Capitação (Capitation)
Neste modelo, o prestador recebe um valor fixo mensal por beneficiário (Per Member Per Month – PMPM), independentemente da utilização dos serviços.
Para que seja um modelo baseado em valor, a captação deve incluir incentivos por performance clínica e estar atrelada a metas de qualidade e prevenção, promovendo a integração do cuidado e coordenação assistencial.
Pagamento por Desempenho (Pay for Performance)
Conhecido como P4P, este modelo oferece um pagamento adicional ou bônus ao prestador, condicionado ao cumprimento de metas pré-estabelecidas, geralmente relacionadas a métricas de qualidade assistencial e indicadores clínicos e assistenciais.
Embora não substitua o modelo de remuneração principal (podendo ser fee for service, capitation ou bundle), adiciona uma camada de incentivos por performance clínica, focando em resultados específicos.
Como começar a aplicar modelos de remuneração por desfecho clínico
A aplicação bem-sucedida de modelos de remuneração por desfecho clínico requer uma base sólida de tecnologia, governança e mudança cultural.
1. Mapeamento da linha de cuidado e análise de prontidão
A operadora e o prestador devem avaliar sua maturidade. Isso inclui:
- Avaliação de maturidade digital, infraestrutura e governança.
- Identificação de processos críticos e gargalos assistenciais que impactam os desfechos.
2. Definição de indicadores de desfecho e processo
O sucesso do pagamento por resultado depende da medição correta:
- Estabelecer KPIs clínicos (ex: taxa de reinternação), operacionais (ex: tempo de espera) e de experiência do paciente (PX) como métrica.
- É importante realizar o ajuste de risco populacional para garantir que a remuneração seja justa.
3. Estruturação de integração e interoperabilidade
O fluxo de dados é o coração dos modelos de remuneração por valor em hospitais, o que inclui:
- Unificação de dados assistenciais e financeiros (ERP, prontuário eletrônico, BI).
- Implementação de dashboards, auditoria contínua e gestão robusta de contratos.

4. Criação dos modelos contratuais
A negociação de contratos baseados em desfechos deve ser transparente:
- Definir as métricas de valor que serão remuneradas.
- Estabelecer critérios de elegibilidade claros para o paciente.
- Detalhar os riscos compartilhados e os mecanismos de incentivo e penalidade.
5. Governança clínica e capacitação
O engajamento das equipes é vital para o sucesso dos incentivos por performance clínica:
- Obter o engajamento médico e das equipes multiprofissionais.
- Desenvolver uma cultura orientada a desfechos e responsabilidade em saúde.
6. Pilotos, escalabilidade e melhoria contínua
É fundamental iniciar de forma controlada e evoluir gradualmente:
- Começar com projetos piloto por linha de cuidado (ortopedia, cardiologia, oncologia) ou procedimentos de alto custo.
- Realizar a medição real de impacto e implementar ciclos de ajustes contínuos.
Exemplo de aplicação no Brasil
A migração para remuneração por desfecho clínico é promissora em áreas de alto volume e previsibilidade. Um exemplo prático no Brasil é a aplicação desses modelos na cirurgia ambulatorial.
Os pacotes de cuidado aumentam a eficiência e a resolutividade, pois o prestador é incentivado a tratar o paciente de forma rápida, segura e com foco no desfecho clínico. Ao evitar internações prolongadas e reduzir complicações, esse modelo alinha qualidade assistencial e sustentabilidade financeira.
Ao priorizar a qualidade e a eficiência operacional em saúde, operadoras e prestadores se unem em torno do paciente. Essa é a chave para a sustentabilidade e para a entrega do verdadeiro valor em saúde.
Quer entender a fundo a jornada da remuneração por valor? Acesse nosso guia completo sobre o tema.
Dúvidas frequentes
Quais são os 7 tipos de remuneração?
Os 7 tipos mais comumente citados, incluindo modelos híbridos e de transição, são:
- Fee for Service: Pagamento por item de serviço.
- Capitação (Capitation): Pagamento fixo por paciente/mês.
- Pagamento por Pacote (Bundled Payments): Pagamento fixo por episódio de cuidado.
- Pagamento por Desempenho (P4P): Bônus por metas de qualidade.
- Diária Global: Valor fixo por dia de internação.
- Salário: Remuneração fixa de profissionais em estruturas próprias.
- Modelos Híbridos/Compartilhamento de Risco (Global Budget, Shared Savings): Combinação de métodos para incentivar a responsabilidade em saúde e o compartilhamento de risco.
Quais são os modelos de pagamento dos planos de saúde?
O modelo dominante nos planos de saúde é o fee for service. Contudo, as operadoras de saúde brasileiras estão em transição, buscando implementar modelos alternativos, como:
- Pagamento por Capitação;
- Pagamento por Pacote;
- Pagamento por Desempenho (P4P).
Esses modelos são fundamentais para garantir a sustentabilidade e a qualidade da saúde suplementar, alinhando os interesses da operadora e do prestador aos desfechos em saúde do paciente.
Modelos de remuneração do mercado de saúde?
O mercado de saúde global e brasileiro está em um movimento de convergência para o Value-Based Healthcare. Além do fee for service, os modelos de remuneração por desfecho clínico mais aplicados incluem os contratos baseados em desfechos, os Pagamentos por Pacote e o P4P.
O futuro aponta para a predominância de modelos híbridos de remuneração e o uso de contratos baseados em performance e risco ajustado, que garantem o foco na prevenção e na avaliação de desfechos em saúde.