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Já cometestes erro desta natureza? Leia o que já fiz!

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E quem sabe não discutimos o teu caso... E quem sabe não colaboramos com o sistema:

Para ilustrar a importância de um relacionamento profissional saudável e de uma boa comunicação, em capítulo de livro recém publicado pela Fiocruz, descrevi dois casos vivenciados ao longo de minha trajetória profissional e dos quais guardo forte lembrança. Em ambos, contribui em erros complexos:

Em 2001, eu era residente de Medicina Interna e estava estagiando no setor de Emergência de um hospital. O médico responsável pelo serviço chegou até mim dizendo:

– Quer fazer uma cardioversão?

– O que é o caso? – perguntei.

– Se não quiser, eu mesmo faço! - disse ele.

E, então, eu fiz!

Para realizar o procedimento, a paciente foi sedada. A cardioversão elétrica foi bem-sucedida, fazendo com que o ritmo passasse de fibrilação atrial (a arritmia) para sinusal (normal). Somente depois fui revisar o caso. Tratava-se de paciente idosa, que havia chegado ao hospital com história de palpitações há duas horas. Não apresentava critérios de instabilidade, que costumam justificar uma cardioversão de emergência. O contexto foi interpretado como de fibrilação atrial aguda (até porque a paciente trazia um eletrocardiograma prévio em ritmo sinusal), em que cardioversão elétrica costuma ser opção. Mas, em medicina e na vida, nem tudo que parece ser necessariamente é.

Dona Laura (nome fictício) sofria de hipertensão, insuficiência cardíaca e de fibrilação atrial paroxística. Ela já tinha passado por vários atendimentos em outros hospitais por episódios da arritmia. Se tivesse sido mais bem avaliada na admissão, a simples presença, no exame físico, de desvio grosseiro do ictus para além do quinto espaço intercostal ou de um sopro cardíaco mitral já poderia ter “sinalizado”. Não a examinei. E não sei se alguém a examinou até a decisão de realizar a cardioversão. Se tivéssemos aguardado os familiares da paciente, e havia tempo e estratégias para isso, o diagnóstico correto teria sido realizado. Como Dona Laura demorou a acordar da sedação, foi estimulada. Percebeu-se sinal de lateralização no exame neurológico. A paciente desenvolveu um acidente vascular cerebral – um evento adverso – como complicação do tratamento, que não costuma ser a primeira opção em casos de fibrilação atrial crônica ou paroxística.

Quando eu estava no terceiro ano de residência em Medicina Interna, um médico do serviço de Emergência de outro hospital solicitou que eu fizesse um procedimento para obter o acesso venoso central em um paciente. Questionei exatamente a mesma coisa:

– O que é o caso?

Dessa vez, recebi uma resposta em tom áspero, mandando-me fazer.

Fiz, e o paciente teve uma complicação – hemopneumotórax. A indicação do procedimento era questionável, e, além disso, o paciente tinha uma coagulopatia. A informação sobre a coagulação sanguínea alterada já estava disponível no momento do procedimento, mas só foi observada depois.

Em ambos os casos, o gradiente de autoridade entre o médico residente e o médico supervisor gerou problemas para os pacientes envolvidos. Erros como esses, nos quais um jovem médico (ou, muitas vezes, uma enfermeira) suspeita que alguma coisa está errada ou apenas quer mais informações, mas não se sente confortável em reforçar suas preocupações, infelizmente são frequentes. Isso não ocorre somente na área de saúde. Na maior colisão de tráfico aéreo de todos os tempos, o acidente de Tenerife, pouco antes de dois aviões colidirem causando a morte de 583 pessoas, o copiloto fez ao comandante uma pergunta muito parecida com a minha: “O que é o caso?”. O final desta história todos sabemos.

Para refletir

Você já vivenciou ou soube de alguém que tenha vivenciado alguma situação semelhante às relatadas no texto? Qual foi o resultado? Como você imagina que esse tipo de situação possa ser contornada?