faz parte da divisão Informa Markets da Informa PLC

Este site é operado por uma empresa ou empresas de propriedade da Informa PLC e todos os direitos autorais residem com eles. A sede da Informa PLC é 5 Howick Place, Londres SW1P 1WG. Registrado na Inglaterra e no País de Gales. Número 8860726.

O modelo de seguro não faz mais sentido para doenças crônicas

Article-O modelo de seguro não faz mais sentido para doenças crônicas

Andrew_Toy_2012_Headshot_Small_Gradient

“Há mais ou menos um ano, eu trabalhava na divisão de Cloud do Google, especialmente em produtos de inteligência artificial e machine learning, relacionados à tecnologias empresariais”, disse Andrew Toy, CTO da Clover Health. “Eu sou o responsável pela TI de uma empresa de seguros de saúde que está utilizando a tecnologia para maximizar a sua eficiência no pagamento de seus sinistros. A maioria das seguradoras não têm isso, de pesquisa e desenvolvimento interno. É isso que nos torna únicos!”

Nos Estados Unidos, a saúde não é fornecida no nível social, como é feita em outros países, inclusive o Brasil. Não há hospitais públicos, somente hospitais privados, que podem ou não ter fins lucrativos. O pagamento acontece com o desembolso próprio de cada um ou através de um seguro. Os médicos podem, em teoria, cobrar quanto quiserem por qualquer serviço, e as contas hospitalares não são claras para o usuário, e nem controláveis uma vez que o paciente realiza o check-in no sistema. As contas exorbitantes são uma das principais causas de falência e endividamento familiar nos EUA.

Outro modo de se conseguir assistência médica é através do seguro. São quatro modalidades mais comuns de seguro: Medicare, Medicaid, “Obamacare”, e o seguro através do empregador. Na última, funcionários são providos de assistência através de seu empregador, que compra serviços de seguradoras como a UnitedHealth Group, Cigna ou Humana, para citar. O Medicare e o Medicaid são dois tipos de seguros gratuitos fornecidos. O primeiro, pago pelo governo, para pessoas de mais de 65 anos ou com alguma invalidez. O segundo, pago pelos estados, para a população de baixa renda. Caso o residente não se encaixe em nenhuma das três opções acima, ele pode entrar no Affordable Care Act (ACA), mais conhecido como Obamacare, para que as pessoas comprem seus seguros de forma individual.

A Clover Health fornece serviços exclusivamente para o Medicare. Nesse modelo, os elegíveis se inscrevem na Clover, que passa a ser responsável por todo o seu cuidado. O governo é o segurador e pagador único, mas transfere essa “carteira” para o domínio da Clover, que passa a receber mensalmente para gerenciar esses indivíduos, em um plano chamado Medicare Advantage. “É uma parceria público-privada. A população apta para o Medicare pode escolher se quer ser gerenciada pelo governo, ou por empresas como a Clover. Nesse programa nós temos muita liberdade em termos que como conduzir o tratamento, otimizar a atenção. Nós temos que manter um padrão de qualidade estipulado, mas as formas de fazer isso são muito flexíveis”, explica Andrew.

Não há a possibilidade de recusa de uma pessoa nesse sistema. Todos aqueles que se inscrevem para receber cuidados da Clover, e se encaixam no perfil do Medicare, são aceitos. Diferentemente dos outros planos, a Clover só trabalha com o Medicare. Isso significa que não é possível espalhar o risco dos pacientes mais idosos entre a população mais jovem. Entretanto, ele diz que é um sistema justo: o governo paga mais por pessoas que estão mais doentes. Andrew comenta que eles avaliam o inscrito e com base em alguns parâmetros, calculam o quanto o governo os deve remunerar.

“Nós só temos pacientes acima de 65 anos ou com invalidez. Temos uma incidência inevitável de muitas doenças. O segredo é ser muito bom em dados e em criar planos de execução que reflitam os dados que eu tenho no manejo da doença”. Ele comenta que os segurados ficam muito surpresos quando recebem o contato da Clover preocupados com a sua saúde, porque no pensamento deles, a seguradora é uma empresa administrativa que paga os sinistros, somente.

Segundo ele, a atenção médica é fragmentada, a tecnologia não é padronizada, os dados não são estruturados, há vários formatos diferentes entre as práticas e alguns médicos ainda usam papel. “Temos que lidar com muitas camadas. Trabalhar na Clover é tentar unificar todas as diferenças encontradas no sistema e criar o melhor padrão de cuidado que pudermos para aqueles que se inscreveram. A nossa crença é que ao trabalhar em uma relação próxima com o médico, nós conseguimos agregar dados e dar uma visão holística do paciente que é muito difícil para qualquer médico individualmente”

Como pagador, a Clover possui uma visão centralizada sobre todos os serviços médicos que estão sendo prestados a um determinado membro. Mesmo que este passe em consultas em diferentes provedores, ou em diferentes níveis de atenção. As informações são reunidas em uma plataforma, e compartilhadas com o médico para aumentar a compreensão sobre aquele indivíduo e proporcionar uma melhor qualidade no cuidado.

“É muito simples, no final do dia nós queremos dar uma grande experiência para os nossos membros e coletar o máximo de informações personalizadas e integrada de diversas fontes de dados, de clínicos a sociológicos, então criamos insights através de aprendizado de máquina, e oferecemos como recomendação no ponto de tratamento para os médicos”, disse ele. Funciona assim: imagine que um paciente procure um médico com uma enxaqueca, sem mencionar nenhum histórico. Quando o médico abre o sistema da Clover, ele descobre que esta mesma pessoa caiu e bateu a cabeça 2 semanas atrás, e deu entrada no pronto socorro, e que também foi a um outro especialista na semana passada. O médico pode dizer: ‘ok, vamos tratar a sua enxaqueca, mas vamos conversar sobre a sua queda? Com que frequência isso ocorre?’

Há o benefício do melhor cuidado médico, mas também há o benefício financeiro para a seguradora. Se o médico investiga e tem todas os recursos para proporcionar a melhor qualidade assistencial, provavelmente o paciente não terá outro incidente agudo, como por exemplo, a entrada no pronto-socorro por queda, que pode custar US$ 10 mil a visita.

Outro exemplo de como a plataforma da Clover pode ser útil: existem muitas pessoas com doença renal crônica em estágio 2, mas nem tantas quanto o esperado em estágio 3. Eles perceberam que muitos médicos esperam até que os pacientes manifestem sintomas para solicitar exames que comprovem a evolução para o estágio 3. Os algoritmos da seguradora combinam dados como o tempo médio de progressão da doença com pesos personalizados e sugerem que o médico solicite exames para o diagnóstico. A Clover paga pelos exames preventivos porque entende que a evolução da doença pode ser muito mais custosa se diagnosticada tardiamente.

“Estamos observando as crescentes cargas que as doenças crônicas trazem ao custo de saúde, e o modelo de seguro não é algo que faça mais sentido no contexto das doenças crônicas”, provoca Andrew, “O seguro foi desenvolvido como uma ferramenta para divisão de risco de um evento catastrófico em uma população, para garantir que um indivíduo sobreviva financeiramente. Se você for um comerciante no século XIX com dois navios, e um deles afunda, você está falido. Então mercadores se reuniam e arrecadavam uma quantidade, em conjunto, para prevenir que um dos seus entrasse em falência, com a reposição do navio, através deste montante reserva.”

Doenças crônicas não são eventos catastróficos que acontecem com uma parcela da população. Pelo menos, não mais. Historicamente, se uma pessoa tivesse diabetes ela morria. Se ela tivesse câncer, não seria fornecido tratamento quimioterápico por 10 anos. Eram doenças agudas e terminais, eventos. Do ponto de vista de uma seguradora automotiva, é como se o seguro do carro não estivesse incluso somente a batida, mas também o consumo da gasolina, a manutenção do carro e todas as despesas relacionadas. As seguradoras de saúde estão pagando pelas doenças crônicas, o que é muito semelhante a pagar pela gasolina do carro.

“Não é surpreendente que o sistema esteja quebrado. Temos uma carga crescendo e cada vez é mais difícil pagar por esse risco populacional. Estamos muito mais em um serviço de assinatura, no qual paga-se mensalmente por um conjunto de serviços, do que no business de seguro. Quando percebemos esse modelo, foi algo muito poderoso! É um problema que envolve tecnologia, gestão e alocação de capital”. Nos Estados Unidos existem diversos orçamentos diferentes, e segundo ele, ninguém olha para isso de forma geral. Estão tentando sempre solucionar o custo crônico, sem uma política estruturada de atenção primária, por exemplo.

Entre as alternativas que a Clover está atuando, estão o cuidado domiciliar, a ampliação do espectro de cuidado de uma seguradora e a telemedicina. O cuidado domiciliar, quando aplicável, produz resultados excelentes em termos de redução de custos e experiência do paciente, muitas vezes proporcionando resultados clínicos melhores do que no ambiente tradicional hospitalar.

A Clover também equipou algumas casas com assistentes virtuais, como piloto. No caso de acontecer alguma situação médica, ou suspeita pelo sistema de predição, um profissional entra em contato para auxiliar na melhor orientação.

Na ampliação do espectro de cuidados de uma seguradora, a Clover investe em assuntos socioeconômicos, como moradia ou alimentação. “‘Se fizer sentido dar abrigo aos membros sem-teto, ou realizar reformas na arquitetura de sua casa para evitar quedas, nós vamos fazer! Nós vamos intervir no tabagismo ou na falta de uma alimentação equilibrada. Podemos enviar alimentos saudáveis na porta da casa deles, ou até refeições já prontas.”, e completa, “Não queremos estar restritos ao que é considerado tratamento médico. Não existe um código que eu coloque no sistema para essas ações. Não importa que isso não seja tradicional, no final do dia queremos um resultado de saúde melhor para os nossos membros.”, conta Andrew.

A Clover também possui um business B, a parceria na utilização de seus modelos preditivos por seguradoras de outros países. Andrew conta que passou muito tempo na Ásia, e eles estão fornecendo seus modelos de análise para que os asiáticos usem em sua própria base de dados, otimizando o algoritmo no cálculo de risco e proposta de insights. “Nesse cenário não somos mais uma seguradora, somos uma empresa de plataforma de tecnologia, que executa seus negócios de forma muito personalizada e direcionada”

“Esperamos criar formas de evitar que os custos explodam, e como seguradora, ampliar a perspectiva de negócios. Queremos criar progressivamente uma melhor experiência para os nossos clientes. Isso é uma forma de dizermos que o setor precisa se mover em direção ao futuro”, finaliza o executivo.