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Saúde mental: um tema ainda negligenciado

Article-Saúde mental: um tema ainda negligenciado

Saúde mental: um tema ainda negligenciado
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“Não há saúde sem saúde mental”

(WHO,2005)

Atualmente é consenso que a alta prevalência de doenças, o início precoce na vida, a persistência e potencial incapacitação dos distúrbios mentais e emocionais podem trazer grande impacto na qualidade de vida das pessoas.

O estudo “Global Burden Disease” apresenta um indicador relacionado aos anos de vida com incapacidade (YLD) e o Institute for Health Metrics and Evaluation, da Universidade de Washington, coloca quatro distúrbios relacionados à saúde mental no ranking dos “top 10” causadores de incapacidade no Brasil. São eles: depressão (2.o), ansiedade (3.o), uso abusivo de drogas (9.o), uso abusivo de álcool (10.o).

Este estudo também constatou que o número de anos de vida com incapacidade (YLD) para distúrbios mentais e abuso de substâncias aumentou 45% entre 1990 e 2013. Estas informações tornaram claro, para o mundo todo, o grande impacto global das doenças mentais e a necessidade urgente de sua abordagem adequada, reduzindo o sofrimento humano, em várias dimensões.

A relação entre os distúrbios mentais e emocionais e as condições físicas pode ser causalmente cíclica, em que uma pode gerar ou complicar a outra, como por exemplo doença mental levando à má alimentação, pouca atividade física e maus hábitos de saúde e a doença física prolongada pode afetar negativamente o bem-estar emocional.  A depressão está associada com estilo de vida sedentário e consequentemente muitos das questões de saúde que este estilo de vida pode desencadear. Obesidade é comum entre pessoas com doença mental séria, bem como outras doenças como tuberculose, hepatite e osteoporose. O risco de pessoas com doença mental pode desenvolver uma condição médica séria e varia de 50 a 90%, ocorrendo frequentemente em uma idade jovem e levando a morte precoce.

Além disso, a vida nas megacidades é um fator complicador. Um amplo estudo realizado em São Paulo pela Profa. Laura Andrade (USP) constatou que cerca de 30% dos respondentes relataram um distúrbio nos últimos doze meses, sendo mais comum a ansiedade (19,9%), seguido por depressão (11%), distúrbios de controle do impulso (4,3%) e abuso de substâncias (3,6%). A exposição a crimes foi associada com os quatro tipos de distúrbios.  Sabe-se que a alta urbanização está associada a distúrbios de controle de impulso e a privação social com distúrbios de abuso de substâncias. O estudo constatou que apenas um terço dos casos sérios recebeu tratamento no ano anterior. O resultado mostrou que os adultos que vivem em São Paulo têm maior prevalência de distúrbios mentais em comparação com outras áreas no mundo. Por exemplo, a proporção de pessoas gravemente afetadas (10%) foi bem maior do que o observado nos Estados Unidos (5,7%), na Nova Zelândia (4,7%) e em outros 14 países estudados.

A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) juntamente com o Ministério da Saúde apurou, dentre outros fatores, a presença de fatores de risco e patologias relatadas por indivíduos adultos entrevistados em amostras representativas de todo o país. Com relação à depressão, foi estimado que 7,6% das pessoas de 18 anos ou mais de idade receberam diagnóstico de depressão por profissional de saúde mental, o que representa 11,2 milhões de pessoas.

Sabe-se que pacientes com depressão e outros distúrbios de humor apresentam elevados custos em assistência médica em comparação com outros fatores de risco, inclusive obesidade e hipertensão. Além disso, traz impacto significativo na produtividade no trabalho e maior risco de incapacidades.  As pessoas com depressão apresentam piores resultados no tratamento de doenças crônicas e, por isso, é muito importante a integração entre os provedores de cuidados destas patologias e os profissionais de saúde mental. Estima-se que pessoas com diabetes, doença cardíaca, osteoartrite e derrame cerebral tem 1,5 a 2,0 vezes mais risco de depressão. Além disso, para muitas pessoas, sintomas somáticos (como dor de cabeça, lombalgia, dor abdominal) vêm acompanhadas de sintomas de depressão. Para cerca de 69% dos pacientes com depressão, a única queixa é dor. A depressão é frequentemente não reconhecida e nos casos detectados, apenas 30 a 50% recebem tratamento adequado.

Em 2008, a ANS lançou a publicação Diretrizes Assistenciais em Saúde Mental na Saúde Suplementar onde foram abordadas cinco linhas de cuidado para transtornos mentais graves e persistentes, decorrentes do uso do álcool e outras drogas, ansiedade, depressão, saúde mental das crianças, adolescentes e idosos. Desde 2010, a ANS tem promovido a ampliação da cobertura para consultas com psicólogos, psicoterapia e psicodiagnóstico buscando melhorar a atenção à saúde das pessoas com distúrbios mentais e emocionais. O Mapa Assistencial da Saúde Suplementar 2014 mostrou um expressivo aumento no número de consultas psiquiátricas, consultas/sessões com psicólogos, internações psiquiátricas e uso de hospital-dia. Apesar dos esforços da ANS para qualificar a atenção à saúde, propondo linhas de cuidado e de ampliar o acesso a tratamentos, fica claro que ainda há muito por fazer para que haja a atenção integral às pessoas com estas patologias e que não devem ser restritas aos casos agudos ou graves.

O Royal College of Psychiatrists do Reino Unido (2010) propõe algumas ações e programas que podem contribuir para a melhoria do nível de saúde mental da população e que são custo-efetivas: (1)- programas de apoio a pessoas que cuidam de crianças com distúrbios de conduta; (2) intervenções com visitas por profissionais de saúde para mulheres com risco aumentado de depressão pós-parto; (3) programas nas escolas, incluindo as ações de prevenção da violência, do bullying e dos conflitos; (4)- rastreamento e abordagem breve para uso abusivo do álcool;(5) programas de qualidade de vida, inclusive com detecção de depressão no ambiente de trabalho; (6)- terapia cognitiva-comportamental para as pessoas com problemas médicos sem causa aparente; (7) intervenções precoces nos casos de psicoses e detecção precoce da pré-psicose; (8)- prevenção do suicídio.

Fica claro portanto que é fundamental que não se garanta somente acesso a serviços e tratamentos, mas que se busque qualificar o diagnóstico dos distúrbios mentais, principalmente na atenção primária, nos serviços de emergência e nos atendimentos não especializados. Além disso, o atendimento psiquiátrico e psicológico deve seguir diretrizes e orientações baseadas em evidências e os profissionais devem se submeter a aperfeiçoamento técnico constante, inclusive sobre novas modalidades de atendimento. Neste contexto se inclui a inclusão da tecnologia da informação e comunicação (TIC) em suas várias modalidades (aconselhamento, coaching, treinamento profissional), com o uso de vários canais (telefone, internet, redes sociais) para que se busque a melhoria do estado de saúde e bem-estar da população.