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Parto cesariana a pedido. Mais burocracia?

Article-Parto cesariana a pedido. Mais burocracia?

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Acrescenta-se burocracia, mas não no sentido pejorativo e sim no sentido de direcionar condutas que visam assegurar o médico e a paciente.

A recém Resolução CFM 2.144/2016 tem apenas quatro artigos, mas com importante norte que envolve a rotina do médico obstetra para a realização do parto cesariana a pedido da gestante.

O não cumprimento do comando da Resolução em estudo poderá implicar em responsabilidade ética do médico perante o CRM e civil perante a Justiça. A gestante pode optar, quando em condição eletiva, pela realização do parto cesariana. Para tanto, o médico tem o dever de lhe informar com linguagem clara e acessível, inclusive com o cuidado de adequar às características de entendimento da paciente, todos os riscos do procedimento cirúrgico e tudo que envolve este tipo de parto em relação a ela e ao filho que nascerá.

As informações passadas verbalmente devem, obrigatoriamente, ser registradas no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido a ser assinado pelo médico e paciente. Também na redação deve o médico seguir a mesma linha de linguagem acessível e pormenorizada.

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Ter ou não ter?

Referido documento não deve ser simplesmente um formulário padrão sem especificações, sem explicações e sem esclarecimentos, como não é incomum me deparar na lida de processos éticos e judiciais, mas sim a reprodução detalhada do que foi dito à paciente.

Lembrando que se trata de prova cujo ônus é do médico e/ou serviço de saúde produzir e a sua ausência poderá trazer sérias complicações. Para o Conselho Regional de Medicina (CRM), local onde inicialmente tramita o processo ético contra o médico, a base legal principal para a caracterização do cometimento da infração ética está, fora a própria Resolução em debate, notadamente no art. 22 do Código de Ética Médica (CEM), que determina que é vedado ao médico deixar de obter consentimento da paciente, salvo em caso de risco iminente de morte.

Para a Justiça Cível, eventual ação de responsabilidade civil baseia-se no dever do médico de informar o paciente com fundamento legal, especialmente, no art. 6º, inc. III, do Código de Defesa do Consumidor.

Referido dispositivo legal cuida dos direitos básicos do consumidor (em que pese no CEM existir previsão – Princípios Fundamentais, XX - de que a relação médico-paciente não é de consumo), sendo que um deles é a informação adequada e clara sobre os diferentes serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

E acima de ambas as normas legais está a Constituição Federal que assegura à paciente gestante a dignidade da pessoa humana, a intimidade, a honra, entre outros, que conforme o caso pode ser invocado.

Apenas para ilustrar a importância do Termo de Consentimento (que já enfrentei em artigo distinto), apresento dois julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo: um que tinha o referido documento e não houve a condenação e noutro não tinha e houve a condenação, ambos relativos aos riscos da falibilidade da Laqueadura Tubária:

Responsabilidade civil. Indenização por danos morais e materiais. Pretensão deduzida por paciente que engravidou após a realização de laqueadura. Alegada falta de informação acerca da eficácia do procedimento. Sentença de improcedência. Pleito de reforma da autora. Descabimento. Prova documental acostada pelo requerido, onde se constata a efetiva ciência da autora, da probabilidade dela vir a engravidar. Inexistência de eficácia absoluta de métodos contraceptivos que, ademais, é de conhecimento geral. Sentença ratificada. Recurso a que se nega provimento. (0000901-65.2015.8.26.0414, de 26.02.2016)

Indenizatória – Erro médico inocorrente – Laqueadura não é método infalível - Falha, contudo, ao dever de informação – .... – Recurso da autora parcialmente provido, desprovidos os demais recursos. (0041641-77.2008.8.26.0554, de 27.08.15)

O médico pode também discordar da realização de parto cesariana a pedido em decorrência da sua autonomia profissional, que é um direito que lhe assiste, ressalvado o risco de morte da paciente.

No caso de discordância sem risco para a paciente não incorrerá em infração ética, mas deve referenciar a gestante a outro profissional.

Outra exigência desta norma é que a cesariana a pedido da gestante, nas situações de risco habitual, poderá ser realizada somente a partir da 39ª semana de gestação (para garantir a segurança do feto). Tudo deve estar devidamente registrado no prontuário da paciente. Como se lê nobre leitor, a normatização ora estudada é um mecanismo de segurança para as partes envolvidas.

Com a lei, pela lei e dentro na lei; porque fora da lei não há salvação. Rui Barbosa