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Quanto vale a nossa privacidade digital?

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Preocupação com segurança da informação vem se tornando maior devido à casos de utilização de dados de forma antiética

Tudo parecia estar fluindo muito bem até que alguns trabalhadores americanos - preocupados em melhorar sua qualidade de vida- começaram a ter dificuldades em entender se estavam participando de programas de bem-estar ou se, na verdade, estavam contribuindo generosamente para ações de marketing que visam obter informações sobre seus hábitos de saúde.

Também pudera. Com o boom de programas online surgidos nos últimos anos, uma avalanche de dados passou a atiçar a máquina de vendas dos EUA para as oportunidades que foram surgindo no universo da saúde digital.

A febre é tão grande que o mercado de soluções corporativas de programas de wellness espera explodir nos próximos anos chegando a atingir um faturamento de US$ 12 Bilhões em 2020 - um aumento de mais de 500% em 5 anos!

O único problema é que até o momento faltou combinar com os russos!

O responsável pelo programa de qualidade de vida dos policiais da cidade de Houston, por exemplo, disse recentemente que não vê problemas em ceder para terceiros, informações como pressão sanguínea e uso de medicamentos da população sob os seus cuidados - contanto que esses dados estivessem anônimos. Já os trabalhadores têm lá suas dúvidas. Afinal esses dados podem causar discriminação por parte de bancos, seguradoras e dos próprios empregadores.

Startups como Audax Health (que pertence à United Health) alegam que não oferecem esses dados para terceiros, embora o próprio regulamento de seu programa contradiga isso. Igualmente ela explica que os dados sobre as pessoas são embaralhados antes de serem utilizados o que dificultaria sua identificação. Dificultaria, mas não impossibilitaria, segundo alguns data scientists americanos.

Nesse mesmo contexto o CEO da bilionária Under Armour foi mais direto ao ponto. Quando adquiriu o MapMyFitness (outro app para ser usado em programas corporativos de bem-estar e qualidade de vida), declarou que “esperava vender muitas camisetas e tênis com o acesso àquelas informações.

Se for esse o caso, então a Fitbit já pode ir acendendo os rojões, uma vez que espera que 13 milhões de vestíveis sejam utilizados em programas internos de empresas até o ano de 2018!

Na contramão dos vendors há organizações não-governamentais dedicadas a acompanhar a questão da privacidade de dados vendo essa euforia com menos entusiasmo. Segundo o World Privacy Forum, “ se as pessoas estão sendo encorajadas a acessar um site, utilizar um vestível e baixar um aplicativo no smartphone para participar de um programa de bem-estar, elas podem ser surpreendidas com as diferentes formas como essas informações podem ser usadas e por quem”.

Claro, nada disso é totalmente novo no mundo digital. Todos sabem que os serviços da Google e Facebook são de graça para o usuário final, mas cada vez mais caros para quem quiser utilizar esses dados para se comunicar com grupos de pessoas ou realizar estudos de economia comportamental para embasar projetos dos mais variados.

A partir do momento em que essa filosofia é aplicada no mundo da saúde, com pessoas oferecendo seus dados sigilosos para encontrar uma solução para seus problemas, uma nova preocupação aflora no centro da questão.

Aliás por falar em Google e Facebook, vale lembrar que nem o WebMD – o maior portal de Saúde do mundo - está à salvo de suspeitas com relação aos negócios que faz com as informações sobre nossa saúde.

Quem usa o site sabe que, de tempos em tempos, eles enviam alguns formulários online para coletar alguns dados novos sobre os diversos aspectos dos nossos sintomas, medicamentos, efeitos adversos, atividade física etc.

A atuação do portal começou a preocupar a opinião pública quando vieram à tona notícias de que os patrocinadores dessas enquetes influenciariam também naquelas recomendações que são apresentadas ao final das respostas.

Uma das acusações é de que numa enquete sobre depressão patrocinado pela farmacêutica Elly Lilly (fabricante do blockbuster Cymbalta) havia uma recorrência muito alta de recomendações para que os respondentes procurassem um médico por estarem em situação de risco.

Fato ou boato, não sei, mas o Senador americano Charles Grassley já pediu a abertura de uma investigação.

Agora quem está no alvo é a Monsanto.

Em fevereiro de 2015 o grupo US Right to Know solicitou acesso à correspondências entre 40 pesquisadores ligados à universidades públicas e 36 empresas privadas. O objetivo era descobrir se os primeiros estavam sendo favorecidos para elogiar alimentos geneticamente modificados produzidos pelo segundo grupo.

Na mesma época o jornal New York Times apresentou uma lista de mensagens que comprovaria a suspeita, já que numa dessas mensagens haveria menção clara ao relacionamento da Monsanto com o site WebMD (coincidentemente muitos artigos publicados no site ultimamente têm apresentado a marca da multinacional com os dizeres “É hora de uma discussão aberta sobre alimentação” com links para sites da companhia).

Isso caiu como uma bomba junto à opinião pública, em especial junto aqueles que se lembraram de que no ano de 2008 o site realizara uma campanha com a CBS News esclarecendo ao internauta sobre as formas de navegar com segurança para questões de saúde e concluindo que o WebMD seria um destino “seguro e imparcial”.

Imagine só. Com o site repleto de anúncios de medicamentos, uma preocupação desse tipo é tudo que deve ser evitado na cabeça do usuário final.

Repito: essas situações não são exclusivas da saúde digital. Na verdade fazem parte de um novo momento que atinge os negócios. Recentemente o próprio Facebook virou vidraça ao anunciar que iria compartilhar com a agência Nielsen o conteúdo das mensagens privadas que nós trocamos através do Messenger a fim de conhecerem nossa opinião sobre programas de televisão.

Na direção oposta, no começo desse ano veio à tona o projeto de construção de uma nova camada de infraestrutura de segurança na internet chamada Privategrity.

No Brasil ainda não existem questões desse tipo chamando a atenção do grande público, mas o nosso ecossistema de saúde digital está apenas se formando. Mas é desnecessário dizer o quanto nosso país apresenta condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento de todas as formas de contraversões imagináveis.

Por isso é bom observar desde já essas situações em outros países, até para que elas nos obriguem - desde já! – a considerar que a letra “E “ de E-Health pode incorporar também o importante significado da palavra Ética.