No filme francês ?Os intocáveis?, dos diretores Olivier Nakache e Eric Toledano, um milionário tetraplégico seleciona pessoalmente quem será seu próximo cuidador. O paciente é conhecido por fazer qualquer profissional desistir da empreitada, tamanho o seu nível de exigência e, por vezes, de pirraça. Em dado momento, ele consegue escolher a ?pessoa certa? sob seu ponto de vista: aquela que lhe transmite confiança e não demonstra piedade.

O cuidador  já é visto como uma das profissões do futuro, já que em um amanhã onde se vislumbra  o aumento da expectativa de vida da população e a crescente incidência de doenças crônicas,  esse perfil ganha cada vez mais importância na sociedade.  É ele quem ajuda o paciente em tarefas cruciais para o bom tratamento: alimentação e medicação nas horas certas e cuidados com a higiene.  O Ministério do Trabalho considera a prática como uma ocupação e não uma profissão, com os mesmos direitos de um empregado doméstico. Mas isso está longe de significar a carência de postos de trabalho, pelo contrário.

O Hospital São Vicente, em Curitiba (PR), administrado pela Fundação de Estudos da Doenças do Fígado Koutolas Ribeiro (Funef), percebeu  na prática o quanto esse profissional era importante para a manutenção do tratamento e da qualidade de vida de seus pacientes e que isso impactava diretamente no tempo de internação e no número de reinternações.

A entidade atende uma população com grande quantidade de idosos e crônicos.  De acordo com o superintendente administrativo, Carlos Alberto Motta,  observou-se que, muitas vezes,  o paciente que  precisava continuar o tratamento em domicílio era reinternado.  ?As pessoas são negligentes no tratamento e percebíamos que o paciente voltava, era necessário um suporte da família. Tínhamos de treiná-la?, lembra.

Normalmente, o cuidador é alguém da família que se propõe a tratar do parente acamado. E foi com o intuito de capacitar os familiares, esclarecendo  dúvidas quanto ao manejo e cuidado com o paciente, além de proporcionar o alívio das ansiedades geradas no dia a dia, que nasceu um curso aberto não só para os familiares, mas para toda a comunidade.

Em 2009, o hospital começou a oferecer o curso de capacitação para cuidadores, coordenado pelo Serviço de Psicologia Hospitalar e pelo departamento de Ensino e Pesquisa, com duração de 120 horas, 80 teóricas e 40 práticas,  e ministrado por uma equipe multiprofissional do próprio São Vicente, composta por psicólogos , enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, farmacêuticos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais.

?O diferencial é que o treinamento é feito dentro da própria rotina do futuro profissional e do idoso?, conta Motta, acrescentando que a Funef tem parceria com dois asilos da região.

De lá para cá, o projeto já formou, gratuitamente, 350 pessoas.  São realizados dois cursos por ano e há uma fila de espera de 300 pessoas. Com o projeto, a instituição capacita mão de obra local para uma ocupação em falta e, desta forma, contribui para o desenvolvimento da área social do entorno, além de suprir uma carência de mercado que tem alto impacto nas contas hospitalares: a reinternação e a extensão da internação.

Para continuar em um tratamento em regime de internação domiciliar, hoje, no Hospital São Vicente, a estratégia de cuidado deve estar alinhada. ?Se o binômio cuidador-paciente não está resolvido, mantemos a internação hospitalar.?

De Curitiba para o Brasil

O superintendente geral do Hospital São Vicente, Marcial Ribeiro, quer levar o projeto à Brasília e torná-lo nacional. ?Apresentei ao Ministério da Saúde, pois o que falta é treinamento prático e contínuo.  Este é o nosso objetivo, levar o programa, que teve adesão de cerca de 300 pessoas, para o nível nacional, como forma de fazer o  melhor atendimento, diminuindo o custo  para todo o País?, conclui.