Há 25 anos, quando o engenheiro biomédico Mark Humayun pensou em colocar um computador dentro dos olhos de pessoas que não podiam mais enxergar, a ideia parecia tirada de um filme de ficção científica. Hoje já é uma realidade. Pesquisadores brasileiros do departamento de oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) mantém uma parceria com Humayun há 15 anos e o ajudaram a criar o olho biônico, aprovado em fevereiro desse ano pela Food and Drug Administration (FDA), agência responsável pelo controle de medicamentos e tratamentos nos Estados Unidos. Detalhes dos estudos e do aparelho serão apresentados durante os Congressos Brasileiro e Pan-Americano de Oftalmologia 2013, que acontecem entre os dias 7 e 10 de agosto de forma compartilhada e única no Riocentro, no Rio de Janeiro.

De acordo com Maurício Maia, professor da Escola de Medicina da Unifesp e um dos brasileiros envolvidos no projeto, o olho biônico é uma visão artificial na qual o microchipe é colocado sobre a retina dos pacientes cegos que ainda têm células retinianas viáveis. “Ele é inserido por meio de uma cirurgia chamada vitrectomia. O procedimento leva entre duas e três horas para ser concluído”, explica.

Recuperação da visão

Chamado Argus II, o aparelho não restaura completamente a visão, mas permite que pessoas que sofrem de retinose pigmentar – doença de origem genética que leva à cegueira – detectem imagens como as faixas de pedestres, a presença de pessoas e grandes números e letras. “Pacientes cegos ou que têm apenas percepção luminosa melhoram a visão em aproximadamente 5%, o que é um grande ganho para quem nada enxerga. A imagem ainda é primitiva, em preto e branco, mas com os novos modelos de chipe acredita-se que em breve os pacientes irão enxergar com uma resolução melhor”, acrescenta Maia.

Segundo Francisco Stefanini, especialista em Retina e Vítreo da Unifesp e um dos 19 cientistas brasileiros envolvidos com o projeto, o primeiro paciente a receber o implante foi uma mulher, em 2007. “Essa senhora é atendida no Doheny Eye Institute e acompanhada por Mark Humayun. Ao longo desse tempo ela tem passado por consultas e vem evoluindo muito bem, sem alterações no aparelho”, conta.

Cooperação internacional

Diversos países estão envolvidos no projeto, que contou com investimentos da National Aeronautics and Space Administration (NASA) e do National Institute of Health (NIH). “O Brasil atua ao lado de países como Estados Unidos, Inglaterra, México, Suíça, França, entre outros”, conta Stefanini. De acordo com Michel Eid Farah, professor do Departamento de Oftalmologia da Unifesp e um dos médicos responsáveis pela escolha dos brasileiros que trabalham no projeto, várias áreas do conhecimento estão envolvidas no estudo. “Engenheiros, oftalmologistas, neurocirurgiões, cirurgiões de órbita, biomédicos, enfermeiros, entre outros profissionais integram o trabalho, que é multicêntrico e multidisciplinar”, conta.

Ao longo de 15 anos, aproximadamente 60 pacientes foram submetidos à cirurgia de implante da prótese. “Desses, 30 pacientes estão envolvidos no estudo e cerca de outros 30 já estão com os implantes comerciais”, afirma Stefanini. Ainda de acordo com o médico, além dos EUA, o Argus II já foi aprovado pelo órgão regulador da União Europeia e da Arábia Saudita. “Fernando Arevalo, vice-presidente executivo da Associação Pan-Americana de Oftalmologia (PAAO) e professor de oftalmologia do Wilmer Eye Institute, na Universidade Johns Hopkins, foi responsável pela primeira cirurgia no Oriente Médio, no ano passado”, acrescenta.

O preço do tratamento promete ser um problema, já que o olho biônico custa US$100 mil. Porém, de acordo com Mark Humayun, o custo benefício faz valer a pena. Mas ele acredita que, com os avanços nas técnicas de fabricação, o tratamento tende a ficar mais barato. “Temos que lembrar que foram investidos US$ 200 milhões para desenvolvê-lo”, justifica.

Mais avanços e desafios

Segundo Farah, as próximas etapas da pesquisa envolvem aumentar o número de pixels (eletrodos) do chipe, criar um modelo wireless (sem cabo), bem como aprimorar a técnica cirúrgica. “Esperamos em breve poder disponibilizar o chipe no Brasil, mas para isso é preciso a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”, explica.

Administrar as expectativas das pessoas é considerado por Humayun um dos maiores desafios a serem enfrentados. “É importante que sejamos claros sobre o perfil de pessoas que serão beneficiadas com o implante. Não podemos alimentar falsas esperanças”, explica. De acordo com Maurício Maia, pessoas que sofrem de imunossupressão sistêmica intensa, possuem atrofia no nervo ótico total ou têm ausência de células viáveis na retina interna, não podem passar pelo procedimento.

Congressos Brasileiro e Pan-Americano de Oftalmologia 2013

Devido a sua importância, o olho biônico será discutido por diversos profissionais nos Congressos Brasileiro e Pan-Americano de Oftalmologia de 2013. O simpósio sobre o tema acontece no dia 10 de agosto (sábado) e será um dos destaques do evento, organizado pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) em conjunto com a Associação Pan-Americana de Oftalmologia (PAAO).

“São esperados mais de oito mil congressistas de todas as Américas”, adianta Paulo Dantas, secretário geral dos congressos. Com uma programação científica em 18 salas com simpósios, painéis e solenidades especiais coordenados por profissionais dos três idiomas (português, espanhol e inglês), o evento conta com as participações de 500 palestrantes estrangeiros já confirmados representando 20 países e 700 brasileiros.

SERVIÇO:

Congressos Brasileiro e Pan-Americano de Oftalmologia de 2013

Data: de 7 a 10 de agosto de 2013.

Local: Riocentro – Rio de Janeiro

Informações: 11 3266-4000

Site: www.congressocbo.com.br

Simpósio de Visão Artificial

Data: 10 de agosto de 2013

Horário: de 13h a 14h30