Se você pudesse destilar 600 milhões de anos da evolução animal em uma única expressão, ela seria: “prever ou desaparecer”. Foi no período Ediacarano, quando o mar começou a encher-se de bocas famintas, que apareceram os primeiros neurônios, pequenas células com propriedades elétricas cuja única função é avisar ao músculo: “mexa-se”. A lógica era brutal: quem conseguia deslocar o próprio corpo antes de o predador abocanhar, ganhava mais um dia de vida. Sem movimento não havia escolha, e sem escolha não havia amanhã: por isso, lesmas microscópicas ganharam circuitos nervosos, enquanto placozoários ficaram para trás. As ascídias (seres marinhos em forma de saco) expõem essa regra com ironia darwiniana: na fase juvenil, nadam livres pelo oceano, ostentando um minúsculo cérebro. Quando encontram um rochedo, colam-se nele, dissolvem o encéfalo e vivem o resto da vida como um saco filtrador. Movimento eliminado, cérebro reciclado, caso encerrado.

Conclusão: “o sistema nervoso existe para colocar a matéria orgânica em movimento e, ao fazer isso, empurra o organismo para dentro do futuro”. Em palavras simples:o sistema nervoso existe para aqueles que se movimentam, e o cérebro existe para aqueles que precisam antecipar o futuro. No ecossistema de Saúde, isso é uma “súmula secular”: ou você se movimenta e acompanha o futuro, ou vira craca, crustáceo marinho que se aferra a um rochedo e definha até se decompor.

Mover-se é apenas metade da história. Cada passo altera o ambiente e cria riscos inéditos. Para não saltar rumo ao abismo, os mesmos circuitos neuronais (neurais) que comandam os músculos passaram a simular o cenário adiante, como quem aperta preview num editor de vídeo. Nasceu daí a verdadeira vocação do cérebro: “uma máquina virtuosa que ensaia o futuro antes que ele aconteça”. Trata-se de umafábrica interna e precisa com ingredientes poderosos: (1) Memória: registro do passado, porque o melhor palpite sobre o que virá é aquilo que já veio; (2) Mapa Simbólico: vocabulário neural que aponta coisas fora da cabeça, inclusive para fora do próprio corpo. Ou seja, o mapa que germina a consciência: tornar-se objeto do próprio modelo; e o (3) Algoritmo de Controle: compara a previsão e o fato em tempo real, corrigindo o erro antes que ele nos custe a sobrevivência. A cada segundo estamos pensando em qual será o segundo seguinte.

Como explica o neurobiólogo Rafael Yuste, professor na Universidade de Columbia (Nova York) e diretor do projeto BRAIN, em sua excelente obra “El cerebro, el teatro del mundo” (2024): “se isso soa familiar a você, não é coincidência. A natureza programou algo fantástico: visões, sons, dor e cheiro entram pela periferia, colidem com o que o cérebro esperava e, se não batem, disparam um sinal de ajuste. Feedback não é luxo; é a essência da vida animal”. Assim, quando tudo converge e a memória está afiada, o organismo realiza seu truque magistral: escolhe, entre os infinitos cenários simulados, aquele que maximiza a chance de procriar e “não virar carcaça”. Cada contração muscular é um voto num futuro desejado.

“É por isso que a proa do avião, a cabeça de um tubarão e o olhar do Homo sapiens apontam sempre para frente. O encéfalo não foi projetado para contemplar o presente; ele é um motor de antecipação e previsão, encarnado em plasma e osso. Pensamento, emoção, arte ou ciência são derivações elegantes desse princípio primitivo: prever para sobreviver”, explica Yuste. Assim, da faísca elétrica que percorre a água-viva ao cálculo de um matemático, corre a mesma corrente metafísica: vivemos suspensos entre o que já foi e o que ainda não é, movidos pelo imperativo biológico de fabricar futuros possíveis antes que o mundo nos imponha algum outro. A neurobiologia inteira cabe nesse teorema de uma linha: o cérebro é o órgão que transformou o tempo em estratégia, existindo apenas para projetar o futuro e não sermos abatidos por ele”.

Nesse sentido, nada assusta mais do que a velocidade das transformações na Saúde, um setor que geralmente não tem tempo e muito menos estratégia. Por tudo isso, “aviso aos navegantes”: resta pouco menos de cinco voltas do calendário (nada além de cinco anos) para que hospitais, operadoras, varejo e manufatura de fármacos, bigtechs, healthtechs, academia médica e o Estado pivotem rumo ao “Paciente-2040”. Quem não redesenhar e planejar o ‘dna-assistencial’ desse “alien” em incubação será expelido da cadeia de saúde antes mesmo de ouvir o som das rachaduras em suas fundações.

O novo usuário dos sistemas de saúde está sendo parido nas bordas do tempo com enorme velocidade. Chegará híbrido e impaciente aos portais do atendimento, como um autóctone, um antroposoma digital (estado em que biologia, cognição e sociabilidade formam um ecossistema mediado por IA), hiperconectado, aferido por sensores em tempo real, aumentado por IAs que decifram e avaliam seus biomarcadores a cada segundo, tropeçando por entre legiões de desempregados “desautomatizados”, e, principalmente, assustado, mais velho, mais doente e mais solitário.

Em 2040 (um pouco mais cedo ou mais tarde), esse paciente exigirá consultas on-demand (24×7), contratos inteligentes em blockchain, cocriação de planos terapêuticos, transparência algorítmica para riscos e benefícios, interoperabilidade-agêntica, etc. Será um consumidor embalado por experiências cotidianas e habituais com as IAs. Ou os líderes das Cadeias de Saúde aprendem, agora, a destrinchar e conhecer como será esse paciente-singularizado, construindo novas fundações que suportem esse, como diria Nietzsche, Übermensch (“além-do-homem”), ou terão vaga demarcada no cemitério dos CNPJs. Esse é o desafio deste paper: arremessar o leitor para o devir, mostrando algumas evidências que já nos permitem estudar quem será o Paciente-2040, principalmente considerando as tecnologias que já despontam e moldarão o seu futuro. Não se trata de futurologia ou qualquer excursionismo oportunista dirigido por buzwords. É tão somente uma oficina projetiva, um exercício ensaístico de preparação para o que vem pela frente. Afinal, essa é a mais relevante tarefa de nosso córtex cerebral: antecipar os movimentos futuros.

Todos os sistemas de saúde (notadamente os públicos) se encontram hoje à beira de um abismo existencial. As mudanças demográficas e o envelhecimento populacional aumentam a demanda por serviços de saúde já sobrecarregados. A questão no NHS, por exemplo, resume-se em seu site: “reformar ou morrer”. “Podemos continuar no caminho atual, fazendo ajustes em um modelo cada vez mais insustentável, ou podemos tomar um novo rumo e reimaginar o NHS por meio de mudanças transformadoras que garantirão sua sustentabilidade para as gerações futuras. Precisamos representar uma ruptura com o passado”, completa o mais ambicioso sistema público de saúde do mundo. A diferença entre utopia e distopia é o tempo de preparação, e sem antecipação só conseguimos gerar entropia.

Com base nas projeções da ONU, a população mundial pode crescer para cerca de 8,5 bilhões (2030), 9,7 bilhões (2050) e pico de 10,4 bilhões (2080), com declínio por volta de 2100. São dados que escancaram uma fabulosa máquina de degradação sistêmica (entropia). Nem todos os pesquisadores concordam com esse pico populacional, mas a calamidade não precisa de grande numerologia: toda e qualquer previsão demográfica futura é notoriamente difícil para a Saúde (envelhecimento populacional, aumento de custos, crescimento de patologias crônicas, etc.). O declínio da fertilidade promulga o álibi perfeito e a expectativa de vida ésua moeda de troca. Todavia, para a maciça maioria dos terráqueos, viver muito em 2040 ainda será um desafio ciclópico.

Por outro lado, freando um cadinho o pessimismo, temos um elemento absolutamente transformador no bioma da saúde: a inteligência artificial. Vinod Khosla, o bilionário empresário indiano-americano, acostumado em décadas de investimento em inovações disruptivas, desabafou em recente entrevista no Medium: “Nunca vi um ciclo como este. Entraremos em uma era de abundância tão grande que será muito difícil para as pessoas imaginarem. Até 2040, teremos um bilhão de robôs bípedes realizando mais trabalho do que todos os humanos juntos. Eles começarão na sua cozinha, cortando vegetais, cozinhando refeições, lavando pratos por US$ 300 a US$ 400 ao mês.  Mas, o mesmo robô que limpa sua casa também será seu médico, seu professor, seu tudo”. Exageros à parte, está claro que o motor das IAs vai, definitivamente, transformar o sistema produtivo global, com efeitos ainda mais multiplicadores na biosfera clínico-assistencial. 

Mas quem será esse ‘consumidor de serviços de saúde’ dos próximos anos, mais especificamente por volta de 2040? Que paciente os sistemas de saúde devem esperar para 2040? Quais tecnologias deverão estar ao seu alcance em 15 anos? Hoje, a maioria das pessoas não consegue compreender como a IA afetará suas vidas. A velocidade dos LLMs perturba nossa análise crítica, mas sem ela para perscrutar e garimpar o futuro não há lugar para nós nele.   

As projeções sobre o avanço das IAs na Saúde até 2040 são múltiplas, por isso nos concentramos aqui em obter predições de especialistas, ou seja, pesquisadores, cientistas, médicos e lideranças setoriais. Aqui vão algumas delas:

  • Resultado de 10 pesquisas envolvendo mais de 5.288 pesquisadores e especialistas em IA, estimou que a maioria deles acredita que as AGIs (IA com nível de inteligência humana) têm 50% de probabilidade de estarem presentes entre 2040 e 2061, com algumas estimativas prevendo que a superinteligência artificial poderá surgir em poucas décadas.
  • Vários centros de pesquisa, por exemplo, já estão usando tecnologias em IA para desenvolver células virtuais, simulações baseadas nos principais blocos de construção de todas as formas de vida, sendo difícil prever o impacto que seus modelos podem ter no mundo da saúde (“Você pergunta ao modelo: Que perturbações preciso fazer para mover esta célula deste estado doente para este estado saudável?”). Até 2040, teremos ensaios avançados de geração de células virtuais na medicina corretiva.
  • Mo Gawdat, Dario Amodei (CEO da Anthropic) e outros executivos que estão por trás da explosão das IAs, explicam cada vez mais amiúde que teremos um período intermediário, transicional e agitado que começará por volta de 2027. Serão cerca de 15 anos marcados por demissões em massa e aumento da desigualdade. “Nesse período, a menos que você esteja entre os 0,1% mais ricos, você é um camponês. Não existe classe média. A consequência será o aumento da pobreza, do isolamento e dos problemas de saúde mental”, explicou Gawdat. Por outro lado, após essa fase inicial, emergirá uma grande oportunidade de transformação a partir de 2040, onde humanos ganharão maturidade na convivência com IAs e poderão se afastar do expediente rotineiro, se concentrando no crescimento laboral e espiritual, cultivando relacionamentos pessoais e privilegiando a convivência coletiva.
  • A mais recente pesquisa AI Monitor 2025, realizada pela Ipsos em 30 países, mostra que “66% dos brasileiros afirmam possuir uma boa compreensão sobre o que significa inteligência artificial, um número próximo à média global de 67%”. Desses, 57% concordam que o uso de IA em produtos e serviços gera entusiasmo e 58% acreditam que as IAs vão intensificar a transformação da sociedade nos próximos três a cinco anos (42% consideram provável que a IA possa substituir seus empregos atuais dentro desse período).

Da mesma forma, é preciso buscar compreender o perfil do ‘consumidor de serviços de saúde’ que chegará às portas dos sistemas públicos e suplementares em 2040. Seguem abaixo alguns indicadores:

  • O paciente de 2040 será definido pela confluência do aumento da longevidade e da alta prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). Isso cria um arquétipo de paciente inteiramente novo: não simplesmente “idoso” ou “doente”, mas um indivíduo “cronicamente ativo”, com múltiplas condições de saúde. Se em 2010 havia 39 idosos para cada 100 jovens, estima-se que em 2040 essa proporção seja de 153 idosos para cada 100 jovens (o segmento 65+ representará mais de 15% da população até 2050). Em 2010, menos de 30% dos indivíduos tinham smartphones; a teleconsulta era uma heresia; idem com o registro eletrônico de saúde; e a computação em nuvem era pura heterodoxia. Mas todas essas tecnologias já eram evidentes em 2010. Dez anos depois (2020+), 700 mil brasileiros pereceram na Covid-19. Que preparação estamos fazendo hoje para o Paciente-2040?
  • As DCNTs já são a principal causa de mortalidade e morbidade, impondo um fardo ainda maior no futuro. A prevalência de condições como obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares, câncer e distúrbios neurodegenerativos (Alzheimer, por exemplo) será o desafio clínico definidor em 2040. Essa perspectiva vai cunhar “pacientes com um senso permanentemente aguçado de vulnerabilidade”. Essa realidade se manifestará em um comportamento dual do paciente: por um lado, uma maior demanda por medidas preventivas, por outro, uma maior ansiedade relacionada à saúde e à desinformação (ou superinformação duvidosa); e na ponta final uma imensidão tecnológica a sua disposição.
  • Portanto, o Paciente-2040 combinará uma elevada ansiedade (estresse) com um ambiente digital saturado de informação (“infodemia”), onde as opções tecnológicas a seguir serão confusas e pouco adotadas pelos sistemas de saúde. Nesse sentido, o paciente buscará de 2025 até 2040, cada vez mais, caminhos para o letramento em saúde e para reduzir a sua ‘hiperdependência sistêmica’. O Paciente-2040 será um atormentado: tem consciência da sua fragilidade clínico-assistencial, gerada por insuficiências da Saúde Pública e Suplementar, e percebe seu corpo convivendo mal com a passagem do tempo. Um indivíduo com 40 anos em 2040 terá 70% de probabilidades de desenvolver problemas sociomentais de gravidade média. Sempre é bom lembra que estamos falando dos pacientes que estão na ‘mediana nacional do perfil socioeconômico’, onde o acesso à saúde será eminentemente público e precário.
  • O diagnóstico de uma ou mais condições crônicas (comorbidade, multimorbidade ou plurimorbidade) não será mais um evento sugerido (subjetivo), mas tecnologicamente evidente, com múltiplas terapias de acompanhamento. As IAs e a biogenética serão capazes de evidenciar com precisão e predição inúmeras condições crônicas mesmo antes delas apresentarem sintomas. Assim, a multimorbidade será assistida por um processo contínuo que envolve monitoramento, medicação, ajustes no estilo de vida e consultas virtuais com especialistas. Essa relação de longo prazo se assemelha mais a “uma assinatura de serviço de saúde do que a uma compra transacional”. Consequentemente, o modelo demandado pelo Paciente-2040 (para não dizer exigido) se deslocará do seguro-saúde mutualista para um formato baseado em assinaturas ou gestão de longo prazo (por exemplo, um plano de manejo vitalício para diabetes). O valor mais significativo não estará em simplesmente tratar, mas em gerenciar as condições crônicas de forma eficaz e em períodos mais longos, acordados entre as partes.
  • Por outro lado, o conceito de “capacidade funcional” se tornará uma métrica de saúde mais importante do que a “ausência de doença”, até porque não existirá mais essa expressão.Em 2040, estaremos dentro de uma transição de empregabilidade gerada pela automação-hiperinteligente, onde tudo relacionado ao trabalho será instável e muito mais competitivo do que em 2025. A meta principal desse paciente será minimizar o impacto de suas condições crônicas na vida laboral, preservando alguma autonomia para preparação de atividades profissionais sustentáveis (com ou sem “renda universal”). Nada disso ocorrerá sem desconforto e forte ansiedade.
  • O Paciente-2040 será, portanto, mais longevo, mais ansioso, mais crônico, menos otimista com o futuro, ainda que seu status digital, promovido pelas IAs, lhe enseje grande facilidade de ascender culturalmente. No fundo, essa possibilidade de flexibilizar múltiplas escolhas profissionais será também mais uma pressão a complicar sua ansiedade. Esse cenário de risco constante e ansiedade latente criará um novo mercado: “biossegurança psicológica“, uma disciplina médica com maior demanda por cuidados mentais do que em qualquer outra época de nossa civilização. Médicos, de qualquer especialidade, serão obrigatoriamente gestores de saúde mental, muito mais do que já são hoje. As instituições que se posicionarem como fontes autorizadas de “cuidados clínicos pluridisciplinares” terão um imenso espaço mercadológico e social. Em escala, os especialistas médicos serão cada vez mais “curadores de uma vida sustentável”, onde o mental, em muitos casos, terá prevalência sobre o clínico-patológico.
  • O Paciente-2040 será também um voraz usuário de plataformas digitais, sendo que na faixa dos 18+ será um nativo-digital. Sua interação com o mundo utilitarista que o rodeia será completamente diferente do que em 2025. É extremamente provável (85% de probabilidade) que veículos de mobilidade pública serão elétricos (ou outras formas enérgicas renováveis), sem custo ao usuário e com vias exclusivas para carros ‘sem motoristas’. Os veículos pessoais de uso próprio serão incentivados (ou obrigados) a não transitar nas grandes metrópoles. Nesse sentido, o Paciente-2040 se deslocará muito menos do que em 2025.
  • É muito provável (75% de probabilidade) que os seguros pessoais (saúde, vida, catástrofes naturais, etc.) ficarão mais baratos pelo fator da previsibilidade que as IAs vão aportar em todos os setores. Nessa mesma condição de probabilidade (75%), a automação utilitarista/robótica será plena, assumindo um papel orgânico em qualquer atividade produtiva. Em consequência, o Paciente-2040 será multitarefa em sua vida produtiva, com profissionais seniores (70+) crescendo em participação nas atividades observacionais e de suporte à decisão de máquina.
  • Da mesma forma, existe muita probabilidade (75%) de que o número de pessoas vivendo com doenças graves aumentará em 37% até 2040. Assim, a projeção para 2040 é que: 1 em cada 5 adultos (19%) viverá com uma doença grave, contra 1 em cada 6 em 2019 (fonte: The Health Foundation).
  • Em 2040, é bem provável (65% de probabilidade) que 20% a 50% dos empregos e tarefas já tenham sido automatizados, criando uma subclasse de pessoas desempregadas (4 em cada 10 especialistas, 39%, preveem menos empregos devido à IA nas próximas duas décadas, com uma parcela menor deles, 19%, acreditando que esta gerará mais empregos). Há também o fato de que, para muitas pessoas o trabalho é uma razão para viver, o que pode suscitar debates sobre o que significa ser humano e a necessidade de reformas econômicas para redistribuir o trabalho que permanece disponível. Assim, é bem provável que o Paciente-2040 tenha uma empregabilidade volátil, seja multiofício e tenha seu padrão de bem-estar social reduzido entre os anos de 2035 e 2045. Como o capitalismo já nos ensinou, isso significa aumento da desigualdade nos próximos 15 anos.
  • Com a mesma probabilidade (65%), o Paciente-2040 terá grandes facilidades digitais para se autocuidar (autodiagnosticar, automedicar, automonitorar, alfabetizar-se em saúde, etc.), dependendo menos da assistência médica sistêmica. As tecnologias de IoMT, por exemplo, estarão amplamente conectadas com plataformas de IA sendo difundidas e disponíveis para suporte à Saúde, como, por exemplo, “Agentes Pessoais de IA” para acompanhamento diário. 84% dos especialistas acreditam que a IA em 2040 afetará a assistência médica de forma positiva, mas reducionista. Nessa direção, a grande maioria das relações entre médicos e pacientes, principalmente no primeiro e segundo atendimento, será virtual, acompanhada por monitoramento remoto de sinais vitais. O presencial será exceção; e o remoto será a majoritária forma de aceder as cadeias de assistência médica.
  • Provavelmente (50% de probabilidade), a realidade virtual se tornará uma parte notória da vida do paciente e do médico (sim, o Metaverso cambaleou, mas as máquinas de cognição artificial tendem a reintroduzi-lo com muito mais força). Veremos ‘sistemas imersivos de realidade mista’, como óculos comutáveis, lentes de contato inteligentes, sensores corporais para gestão de crônicos e uma enorme quantidade de gadgets para sustentabilidade e acompanhamento sanitário. Dentro dessa probabilidade, o Paciente-2040 estará conectado com clínicas virtuais em qualquer parte do mundo, em qualquer língua e em formato telemédico síncrono, sendo que seu atendente será um robô clínico-assistencial. Nessa direção, provavelmente (50%) até 2040, as máquinas já terão igualado (ou superado) a capacidade de raciocínio humano (fonte: Dr. Rich Sutton, vencedor do Prêmio Turing em 2024).
  • Da mesma forma, provavelmente (50%) o nível de “especialização médica” será cada vez mais concentrado, com ‘Agentes de IA Especializados’ promovendo a interação direta com cada profissional clínico. Por volta de 2040, a formação médica no Ocidente será reduzida para menos de quatro anos, com 70% dos cursos realizados em ambiente de pesquisa clínico-científica, com apoio de IA e utilizando dados sintéticos. A Residência Médica será obrigatória, contínua e periódica (a cada 5 ou 8 anos, médicos voltam para alguma carga de residência clínico-assistencial hospitalar).
  • Com a mesma probabilidade (50%), a ‘enfermagem propelida por agentes IA’ será uma das funções mais valorizadas das Cadeias de Saúde. Em 2040, o centro de cuidado individual, pessoal e residencial não será feito por máquinas (robôs, humanoides, etc.) como se imagina, mas por indivíduos apoiados por cognição artificial (agêntica). Nos próximos 15 anos o domicílio se transforma em primeira linha de cuidado. Até 2040, não haverá robô-multitarefa capaz de substituir o tato clínico, o julgamento situacional e a mediação humana nas zonas cinzentas do cotidiano, principalmente do paciente crônico. Por isso, os chamados “cognware-caregivers” (CoC), profissionais que orquestram e cuidam de “pacientes-domiciliados” utilizando forte suporte de IA agêntica, tornam-se o eixo do modelo assistencial domiciliar. Fontes pagadoras e sistemas públicos passarão a remunerar essa “última milha humana” como serviço crítico, com pacotes por episódio e bônus por desfecho. O CoC também será apoio ao letramento em saúde. O cuidado pessoal domiciliar em 2040 será tecnologicamente aumentado, mas ainda irredutivelmente humano.
  • Provavelmente (50% de probabilidade) boa parte dos Pacientes-2040 estará também condicionada aos modelos de assistência básica em Health Kioskes (cabines, quiosques ou healthstations-abertas), já comum em vários centros urbanos. As “estações de autoatendimento” para checagem de sinais vitais, teleconsulta, testes/exames convencionais e triagem baseada em sintomas terão uso crescente, embora boa parte dessa “telemetria clínica” já esteja disponível em 2040 por meio dos smartphones (ou gadgets residenciais).
  • Com baixa probabilidade (30%), implantes cerebrais ou corporais serão comuns e evolutivos. A impressão 3D será responsável pela geração de mais de 50% dos ativos ortopédicos. Em 2040, com a mesma probabilidade, o varejo farmacêutico (brick-and-mortar) desaparece ou torna-se um centro de intervenção em triagem. A “inclusão tecnológica”, principalmente medicamentosa, terá dois rumos, com 30% de probabilidade para qualquer um deles: (1) será coparticipativa e cofinanciada entre as partes envolvidas, sendo entidades externas aos Sistemas de Saúde (como fintechs e bancos) a sua maior fonte de crédito; (2) por volta de 2040, as bases constituintes que sustentam a “cobertura universal do Estado”, serão reformadas, tendo como base uma redivisão de responsabilidades, incluindo a participação do paciente. Esse “novo mutualismo” será crível e consensuado em 2040, mas vigente só na segunda metade do século.

É difícil prever com qual quadro de doenças o Paciente-2040 chegará aos Sistemas de Saúde. Mas talvez seja possível indicar a probabilidade de algumas patologias já não fazerem mais parte do “cardápio de enfermidades notórias” em 15 anos. Nessa direção, podemos perguntar: em 2040, quais as perspectivas terapêuticas de “cura”, redução de mortalidade/morbidade, ou mesmo recondicionamento clínico ($) das opções atuais de tratamento de algumas patologias? (o protocolo de “cura” aqui envolve sentido de cura funcional (“Sem sintomas ou eventos clínicos relevantes ligados à doença durante pelo menos cinco anos após o ‘fim’ do tratamento”). Algumas probabilidades:

1. Anemia falciforme

  • O que contar como cura? Paciente ficar com mais de 5 anos sem crises vaso-oclusivas nem transfusões.
  • Terapia-chave (status 2025): edição gênica CRISPR exa-cel Casgevy®  (primeira aprovação FDA para SCD em dez-2023) (U.S. Food and Drug Administration).
  • Evidência clínica: estudo do New England Journal of Medicine mostra que 97% dos pacientes tratados estavam livres de crises por pelo menos 12 meses (New England Journal of Medicine).
  • Principais gargalos: preço, necessidade de centros de transplante, expansão para países de baixa renda.

2. β-talassemia transfusional

  • Cura funcional: independência permanente de transfusão.
  • Terapia: mesma plataforma exa-cel, aprovado pela FDA (2024) (U.S. Food and Drug Administration)
  • Evidência Clínica: coortes iniciais mostram suspensão de transfusões em cerca de 80% dos participantes.
  • Gargalo extra: reduzir o regime de condicionamento mieloablativo.

3. Hepatite B crônica

  • Cura funcional: HBsAg indetectável por pelo menos 12 meses após fim do tratamento.
  • Terapia em destaque: combinação de anticorpo tobevibart + RNAi elebsiran (estágio fase III – estudo MARCH) (Vir Biotechnology e parceiros).
  • Resultados parciais (2025): soroconversão sustentada perto de 30% nos participantes, 24 semanas pós-tratamento.
  • Gargalos: resposta imune durável e variabilidade genotípica.

4. HIV-1

  • Meta: carga viral indetectável sem TARV por mais de 2 anos, reservatório latente negativo.
  • Terapias em teste: (1) EBT-101 (CRISPR in vivo, fase I, fast-track FDA); (2) Estratégias “kick-and-kill” com mRNA-LNP + anticorpos neutralizantes de longa ação.
  • Evidência 2024–25: primeiros resultados em nível de segurança, ainda sem prevenção de rebote viral em humanos (aidsmap.com).
  • Gargalos: erradicar reservatórios e custo de terapias celulares.

5. Diabetes tipo 1

  • Meta: permanecer sem necessidade de insulina por mais de cinco anos e manter HbA1c abaixo de 7%.
  • Frente mais avançada: ilhotas derivadas de células-tronco (VX-880). Estudo fase I/II mostra restauração sustentada de C-peptídeo (VRT NewsCGTlive™).
  • Gargalo: imunossupressão crônica ou cápsulas imunes ainda não ideais; braço encapsulado (VX-264) foi encerrado.

6. Alzheimer (estágio inicial)

  • Meta: deter o declínio cognitivo por menos de 5 anos (efeito modificador, não “cura” esterilizante).
  • Achado mais recente: doses baixas de lítio orotato reverteram placas e recuperaram memória em modelo murino; artigo Nature 2025 (cobertura NatureThe Washington Post).
  • Gargalos: traduzir para humanos, detectar precocemente, segurança crônica.

Quadro vacinal:

1. Malária (R21/RTS,S)

  • Visão 2040: cobrir mais de 80% das zonas endêmicas africanas, reduzindo hospitalizações infantis em até 60%.
  • Onde estamos: R21 recomendado pela OMS (2023) e pré-qualificado; Gavi já estruturou rollout que começa em 2025–2027 (Organização Mundial da Saúde).
  • Gargalos: ampliar fabricação e garantir cadeia de frio em áreas rurais.

2. Tuberculose (M72/AS01E)

  • Objetivo: prevenir TB pulmonar em adultos IGRA-positivos.
  • Status 2025: ensaio de Fase 3 completou o recrutamento de 20.000 participantes em 54 centros (África do Sul, Quênia, Maláui, Zâmbia e Indonésia) 11 meses antes do previsto; doses iniciadas em mar/2024 (Health Policy Watch).
  • Gargalos: comprovar eficácia maior que 50% em IGRA-positivos e duração da proteção; desempenho em coinfecção por HIV; capacidade fabril/custo e cadeia de suprimentos; financiamento em países de baixa/média renda.

3. Citomegalovírus congênito (mRNA-1647)

  • Meta: evitar infecção primária em gestantes soronegativas (maior causa viral de surdez infantil).
  • Status 2025: fase III em andamento; DSMB relata segurança e mantém estudo; dados finais previstos para fim de 2025 (CDC; PubMed).
  • Gargalos: demonstrar eficácia clínica (não só imunogenicidade) e viabilizar custo de plataforma mRNA para programas públicos.

4. HIV (vacina germline-targeting com nanopartículas codificadas por mRNA — IAVI G002/G003)

  • Objetivo: induzir anticorpos amplamente neutralizantes (bnAbs) via ativação de precursores (classe VRC01) antes da exposição.
  • Status 2025: ensaios de Fase 1 (G002/G003) concluídos; segurança aceitável; prova de conceito de ativação de precursores de bnAbs; sem dados de eficácia clínica (IAVI Science).
  • Gargalos: demonstrar amplitude/potência com boosts; definir correlato de proteção; avançar a Fase 2b/3; viabilizar custo e fabricação.

5. Gripe universal (“Generation Gold Standard”)

  • Meta: vacina “variante-proof” que proteja por mais de 3 anos contra múltiplos subtipos (H1, H3, H5, coronavírus zoonóticos).
  • Status 2025: programa Generation Gold Standard anunciado (mai/2025); HHS/NIH realocam cerca de US$ 500–550 milhões para uma plataforma universal com vírus íntegros inativados; candidatos em fase inicial de planejamento; ensaios previstos a partir de 2026 (HHS/NIH; Science).
  • Gargalos: provar proteção em amplo espectro em humanos, manter atualização antigênica e capacidade fabril.

Todos os avanços e probabilidades explicitados acima dependem, obviamente, de fatores conjunturais, científicos, virogenéticos/mutacionais e continuidade de investimentos, sem considerar os possíveis avanços novos e disruptivos nas cadeias farmacológicas. Trata-se, portanto, de uma fotografia probabilística aproximada de algumas ações diagnósticas e terapêuticas com alto poder de transformar a sustentabilidade clínica do paciente em 2040 (as condições relatadas aqui foram extraídas de centros de pesquisa e de suas projeções para 2040). Da mesma forma, as probabilidades não consideram efeitos exógenos às cadeias de saúde (pandemias, epidemias, eventos de natureza geopolítica, etc.).

Mas quais “tecnologias digitais-estruturantes” já estão em testagem (benchmark) e devem propelir o cuidado do Paciente-2040? A lista abaixo é uma breve amostra, baseada em vários relatórios de centros de pesquisa e inspirada no “Hype Cycles 2024-25” da Gartner, que as caracteriza como: “em rápida ascensão, devendo atingir maturidade (‘Plateau of Productivity’) entre 2032 e 2040, tornando-se plenamente operacional ao longo dos anos 2030 e início de 2040”. (Observação: a tradução das tecnologias entre parênteses é livre).

  • Digital Patient Twin (Gêmeo Digital do Paciente): réplicas virtuais 4D que antecipam riscos e testam terapias antes da intervenção clínica; Gartner projeta maturidade plena até meados da década de 2030 (ScienceDirect).
  • Agentic/Autonomous Clinical GenAI (IA Generativa Clínica Autônoma): modelos multimodais que redigem resumos de prontuário, sugerem condutas e executam fluxos de trabalho em tempo real e suportam a decisão clínica; listada pela Gartner como “Agentic AI” em 2025 (Gartner).
  • Personalized Neoantigen mRNA Vaccines (Vacinas mRNA de Neoantígeno Personalizadas): imunizações sob medida contra câncer e vírus, com vários candidatos já em fase III (PMC).
  • In-vivo Base & Prime Editing (Edição Genética Base & Prime in vivo): correção pontual de mutações (ex.: anemia falciforme) sem cortes de DNA; estudos de 2024 mostram alta eficiência funcional (Revvity).
  • Skin-Integrated Wearable Sensors (Sensores Epidérmicos Integrados): adesivos inteligentes que monitoram ECG, temperatura e pressão arterial 24/7; plataforma ANNE One já possui clearance FDA (FDA Access Data).
  • Non-Invasive BCI Wearables (Interfaces Cérebro-Computador Não-Invasivas Vestíveis): pulseiras sEMG, como o protótipo Orion/Meta, que decodificam digitação “no ar” a 20 palavras/minuto (Android Central).
  • Magnetic Drug-Delivery Nanorobots (Nanorrobôs Magnéticos de Liberação Direcionada): microrrobôs que levam quimioterapia direto ao tumor; MIT demonstrou fabricação em escala em 2025 (MIT News).
  • Vascularized 3D-Bioprinted Organs (Órgãos Bio-impressos 3D Vascularizados): fígado e rim impressos com redes capilares funcionais, restaurando função em modelos animais (Science Direct).
  • Metaverse XR-Clinic Platforms (Plataformas de Clínica XR no Metaverso): teleconsultas imersivas e reabilitação gamificada que reduzem dor crônica, segundo as revisões de 2024-25 (Scientific Archives).
  • Quantum-Enabled Drug Discovery (Descoberta de Desenvolvimento de Fármacos com Computação Quântica): algoritmos quânticos para gerar moléculas em horas, acelerando P&D (profbanafa.com).
  • AI Virtual Cell – AIVC (Célula Virtual IA): modelos computacionais multiescala que reproduzem a estrutura, a dinâmica e as respostas de células reais, alimentados por dados ômicos, imagem 3D e simulação fechada em loop. Pilotos Stanford/CZI já preveem efeitos de fármacos e redes de sinalização. Expectativa de entrar em ensaios antes de 2035 (PMC ou Nature).
  • Bottom-up Synthetic Cell (Célula Sintética de Baixa Complexidade): vesículas lipídicas com genoma projetado ou circuitos proteicos reconstituídos que executam funções-chave (produção de fármacos, relógio circadiano, locomoção). Relatórios FTI destacam “minimum viable lifeforms” como passo vital para terapias vivas e programáveis em 2030 (Naturefuturetodayinstitute.com).
  • Computational Pathology Genomic Surrogates (Biomarcadores genômicos via Patologia Computacional): modelos que inferem mutações (ex: EGFR) a partir de lâminas H&E (hematoxilina-eosina) digitalizadas de biópsias de adenocarcinoma de pulmão, priorizando  NGS (next-generation sequencing) e acelerando a oferta de terapia-alvo (Nature).
  • AI-Assisted Fetal Ultrasound for Anomaly Detection (Ultrassom fetal assistido por IA para Detecção de Anomalias): uma IA guia o operador em tempo real identificando um plano-padrão, checa a qualidade das imagens em função das características óticas do operadore reduzo tempo do exame em mais de 40% sem perda de desempenho diagnóstico (NEJM AI).
  • Emergency Department AI Triage (Triagem de Pronto-socorro com IA): controla triagem, lê sinais vitais, identifica a queixa principal, ordena os dados no prontuário, gera um score de risco em tempo real, sugere prioridades, aciona protocolos, comunica dados à cadeia de decisão, hierarquiza ações e proteções, etc (NEJM AI).

Do outro lado, nada disso (ações diagnósticas/terapêuticas e tecnologias) reduzirá a iniquidade de acesso à saúde sem uma cesta de “blocos estruturais” que permita a sustentabilidade tecnológica das cadeias de saúde. Alguns exemplos:

  • FHIR-native Agentic Interoperability (padronização e regulação de como agentes de IA devem se integrar);
  • Nation-scale Health Exchange (TEFCA/EHDS), também chamado de Intercâmbio nacional/continental de Dados (cria regras e serviços para troca segura e padronizada de informações clínicas);
  • Verifiable Credentials & Digital ID Wallets (credenciais digitais verificáveis em padrão W3C e IDAS);
  • 5G/6G Network Slicing & Edge Health (redes de “computação de borda” em Saúde);
  • End-to-end Drug Traceability – DSCSA (rastreabilidade mundial de medicamentos, ponta a ponta) e, principalmente,
  • Permissioned Blockchain + Verifiable Credentials & ZK (que utiliza ledgers permissionados para inviolabilidade de ativos, serviços e contratos digitais); dentre outros blocos.

Essa “arquitetura de blocos estruturantes” objetiva padronizar a identidade, confiança, transporte e volume de dados, garantindo desempenho e continuidade. São proteções aos protocolos mundiais de compliance e redução de risco sistêmico. Eles existem exatamente para sedimentar o “solo onde as IAs diagnósticas/terapêuticas vão pisar e escalar”. Não são periféricos sofisticados, mas são o sistema nervoso das inovações em Saúde. Sem esses blocos, nada do que foi descrito acima como características clínicas evolutivas do paciente terá o menor significado. Aliás, a construção desses blocos fundacionais é muito mais uma questão política do que tecnológica.

No quadro atual, o Paciente-2040 tende a ganhar calendário, mas a grande maioria encontrará uma colossal insuficiência assistencial. Isso independe de pesquisas, tecnologias, descobertas ou do potencial transformador das IAs; depende, sobretudo, da visão política e econômica dos gestores, ou da sua inabilidade, covardia e inapetência para pensar e planejar o futuro em conjunto. Chegamos ao ponto em que o cuidado não pode mais reagir ao que acontece: precisa metabolizar o que ainda não aconteceu, mas vai acontecer. É preciso ensaiar o porvir com a mesma severidade e dedicação com que atendemos um quadro crítico na Emergência. É necessário aplicar a razão em 2040, não só em 2025. Miguel de Unamuno (1864–1936), em sua obra “Vida de Don Quijote y Sancho” (1905), deixou o melhor rastro para perseguirmos: “Dom Quixote não morreu louco, mas morreu por ter recuperado a razão. O que era insuportável não era a sua loucura, mas acordar em uma realidade sã demais para se viver”.

Guilherme S. Hummel

Head Mentor – EMI (eHealth Mentor Institute)