No final de 2022, após o surgimento do ChatGPT, o jornal espanhol El Pais publicou: “No es magia, pero la nueva IA supera nuestros limites”. Desde então, as Inteligências Artificiais Generativas, ou seu acrônimo GenAI, deslocaram o centro de gravidade produtivo do planeta. Esse novo “baricentro” transcende as coordenadas geográficas e seus centros de massa; trata-se de um novo epicentro dinâmico que desconstrói os modelos produtivos vigentes, introduzindo uma nova “espécie terrestre”: as máquinas inteligentes. As GenAIs emergem com requintes alquimistas, transmutando indivíduos em entidades digitais multicognitivas, ancoradas em Nuvem. Elas flutuam por cima de nossas mentes, convidando-as a expandir o poder utilitarista humano. Ao mesmo tempo, promovem novas relações entre homens e máquinas, que se entrelaçam e tecem a próxima camada evolutiva da civilização.
Nada disso parece crível, tudo parece exageradamente excessivo, não pode estar acontecendo nessa velocidade... pois é, mas IA está batendo à nossa porta, pedindo espaço e atenção. Nenhuma indústria de serviços precisa tanto dessa nova ordem como o bioma saúde. Entupida de problemas, errâncias e modelos superados, as cadeias globais de Saúde definham ao sabor do quadro demográfico. Se por um lado essa nova “alquimia-generativa” nos perturba e assusta, por outro lado, nos anima e incentiva a utilizá-la para maximizar nossa propulsão, capaz, como num salto olímpico de altura, ultrapassar a “barra clínico-assistencial” deste século. Todos os países correm freneticamente em direção a dominar as GenAIs e trazê-las de modo seguro para o setor de saúde.
Nos próximos 12 meses, mais de uma centena de grandes congressos e seminários sobre IA estarão disponíveis no ocidente. Uma única listagem, de uma única entidade, mostra 24 grandes eventos de IA somente em 2024, sem falar nos eventos menores, que ocorrem nas universidades, em ambientes assistenciais públicos e privados, ou nas “garagens” de startups que nasceram nos últimos meses, aproveitando o estrondo das GenAIs.
No Brasil, precisávamos de um grande fórum na área de Saúde para entender os modelos, observar as aplicações e debater a pertinência das implantações em GenAI. Depois de um ano de planejamento, acontecerá de 21 a 24 de maio o FDHIC-2024 (“Future Digital Health – GenAI Saúde, Brasil 2024”), realizado no São Paulo Expo, dentro do maior trade-show de Saúde da América Latina (um dos 5 maiores do mundo), a Feira HOSPITALAR. O FDHIC é um projeto da Informa Markets, reunindo 10 países e perto de 60 painelistas, que durante 4 dias estarão debatendo uma única temática: o poder das GenAIs no ecossistema de Saúde. Alguns dos maiores provedores globais de GenAI estarão presentes. Todas as importantes plataformas em GenAI foram convidadas. Alguns sequer responderam o convite (Meta, por exemplo), outros desistiram ou não acharam oportuno enfrentar o desafio (Mistral.ai). A maioria dos ausentes teve problemas de agenda, o que nos obrigou a gravar algumas sessões para exibi-las na sala do FDHIC.
“Quem pode mais, deve mais”, diz um aforismo secular. O grupo britânico Informa, espalhado por 30 países e realizando mais de 400 eventos corporativos anuais, organizou o FDHIC-2024, já sendo a maior plataforma informacional de Inteligência Artificial da América Latina. Serão 14 painéis nacionais e internacionais e 10 Rodas de Debates, reunindo especialistas, pesquisadores e lideranças nacionais. Alguns dos speeches internacionais mostram a velocidade de desenvolvimento das GenAIs, notadamente na Saúde. É o caso do painel do Reino Unido, “OSLER - Humanos vs. Assistentes em IA – Navegando nas Mudanças da Documentação Clínica”, apresentado pelo CEO da Tortus.ai, Dom Pimenta. OSLER (Operating System Leverage in Electronic Records) é um assistente digital pessoal orientado a médicos, sendo projetado para privilegiar a privacidade dos dados de pacientes. A grande conquista da OSLER é poder controlar qualquer EHR ou qualquer outro programa (ex. PACS) sem a necessidade de integrações.
Outro assistente médico-pessoal vem da Dinamarca: Corti.ai. Trata-se de uma GenAI para Saúde centrada em “linhas de aconselhamento”. Todos sabem que a retenção e o esgotamento dos profissionais de saúde (burnout) tem drenado a sustentabilidade dos sistemas de saúde. Nesse sentido, a plataforma Corti oferece uma forma para impulsionar a eficiência operacional dos profissionais de saúde e um atendimento de qualidade aos pacientes. A conferência de Andreas Cleve (Co-founder e CEO da CORTI), denominada “CORTI.ai: “Suporte à Decisão impulsionado por IA quando ela mais importa”, destaca como os assistentes pessoais vão revolucionar a função médica, reduzindo em até 50% o seu tempo de documentação. Certamente que um dos painéis mais aguardados é justamente o da Microsoft, cujo Copilot já está sendo usado por vários profissionais e empresas ao redor do mundo. Kathy VanEnkevort (Industry Leader, US Health & Life Sciences Microsoft) vem dos EUA especialmente para apresentar o poder da ferramenta no painel “Microsoft & OpenAI: Copiloto para Suporte a Médicos - Consultas Presenciais ou Virtuais", ressaltando as várias funcionalidades operacionais do Microsoft Copilot e o seu poder de agregar valor quando utilizado em conjunto com o Office 365.
Certamente, existe uma trajetória presente e futura para as GenAIs na Saúde, com várias tendências que impactarão os sistemas sanitários nos próximos meses e anos. Para esse overview, ou seja, uma “fotografia dos caminhos que as GenAIs devem perseguir”, separamos como primeira conferência no FDHIC 2024 o painel “Navegando na Emergência das GenAIs em Saúde”, apresentado por Suzana de Morais (Analytics Director Deloitte Brasil) e Jefferson Lopes Denti (Chief Disruption Officer Deloitte AI Institute), tendo como apoio um dos mais importantes relatórios publicados pela Deloitte sobre GenAIs em Saúde (“Navigating the emergence of Generative AI in health care”). Para os menos familiarizados com o tema Generativas na Saúde, é imprescindível estar presente nessa introdução.
Outro painel virtual (gravado), também abordando os assistentes generativos, vem da Espanha: “Llamalítica: Assistente GenAI para Consulta Médica”, apresentado por Frederic Llordachs (CEO da Llamalitica). Trata-se de uma nova startup que aterriza no mercado europeu com um produto especificamente voltado ao assessoramento da consulta médica. Vale ressaltar que muitos dos assistentes generativos tem dificuldades semânticas com outras línguas que não seja a inglesa. Esse é um dos alvos da Llamalitica.
As trilhas generativas na saúde serão cada vez mais diversas, principalmente nas disciplinas médicas, onde transitam grandes volumes de documentação. Nessa direção, o painel “Gêmeos Digitais para Oncologia de Precisão impulsionado por IA” representa o grau de maturidade da Irlanda em IA. Oran Rigby (Founder & Chair AKKURE.ai), será o speaker dessa conferência, que mostra como a Akkure Genomics está sendo pioneira na integração da Inteligência Artificial (IA) com a Genômica na área de “recrutamento para testes de câncer”.
Outro painel de grande relevância, apresentado ao vivo, é da Anthropic & AWS: “Claude 3 - Anthropic: AWS acelera nas GenAIs", sendo Mauricio Consulo (Head of the Tech Team for Latin America AWS) seu speaker. A plataforma Claude 3 despontou em 2024 como “enfant terrible” do mercado de IAs, principalmente devido a sua capacidade de se adaptar a diferentes domínios bem como por sua capacidade de ser treinada por conjuntos de dados específicos para tarefas específicas. Alguns Casos de aplicação na Saúde serão alvo do painel. Da Alemanha, teremos uma sessão apresentada por Anita Puppe (Strategy Healthcare Consultant on GenAI Implementation, IBM Germany), tendo como título “Telehealth generativo: um colossal salto no atendimento remoto e as terapias auxiliadas por GenAI”. Ms. Puppe estuda e participa de projetos numa das verticais que mais espera resultados com GenAIs: telemedicina. Estamos no limiar de uma colossal transição nessa área, onde devices, IA, biossensores e outros elementos vão trazer inovações maiúsculas no atendimento remoto.
Para ressaltar esse avanço, também dos EUA, teremos Chandler Lewis (RealWear Director) mostrando como a incorporação generativa modificará vários vetores que estavam “esperando por inovação fundacional”, como o Metaverso e as plataformas de Realidade Virtual. Seu speech, “Transformando Fluxos de Saúde com Dispositivos Vestíveis em IA: Caso NHS”, mostra essa evolução, principalmente dentro do NHS. Como estará presencialmente no FDHIC, será uma ótima oportunidade para conversar com Lewis sobre seus múltiplos projetos. Da Hungria, teremos o painel “Como as IAs expandirão a Biotecnologia Molecular e Genômica”, apresentado presencialmente por Mate Szasz (Diagnostic Leader at SYNLAB), que dirige o SYNLAB Hungary, um dos mais importantes Labs de Diagnóstico Médico da Europa. Lembrando: este será o século da Biotecnologia, avançando 50 anos em 5.
Um ponto importante do FDHIC é se tratar de um evento fechado, ou seja, só terá acesso ao seu conteúdo quem estiver presencialmente na sala. Não haverá transmissão dele nem durante ou depois da sua realização. Nesse sentido, outro painel aguardado é do Google (“MedLM & Gemini: transformações na Saúde com GenAI Google”), apresentado por Maurício Craveiro Hauptmann (Head of Healthcare and Life Science do Google). Uma excelente oportunidade para conhecer o pacote GenAI da empresa para Saúde, que nas últimas semanas lançou várias funcionalidades. Sem contar que quando contarmos a história da IA, quiçá daqui duas ou três décadas, o nome Google será um dos mais importantes milestones dessa narrativa.
Uma frase comum nos ambientes de GenAI é: “hoje temos o que de pior uma IA jamais terá". Em outras palavras, estamos nos primórdios da IA como ferramenta utilitarista. Muitos preferem as conotações apavorantes, como: “não sei ainda se GenAI é a nave-mãe do filme “Alien, o Oitavo Passageiro” ou se é a criatura que dizima quase todos na nave”. Nesse sentido, sempre é bom ver como outros países está tratando o tema. O FDHIC analisa o caso da Índia, e como essa gigantesca nação pretende utilizar as GenAIs no ecossistema médico. No painel “Entendendo o impacto da GenAI no ecossistema de saúde da Índia”, Sayantan Chatterjee (Executive Director da PwC India) nos apresenta um draft de seu report, que desvenda como o país vai atuar com as Generativas no ambiente assistencial. É evidente que o Brasil está atrasado nas plataformas de IA, mas é vendo outros países que podemos perceber a necessidade de políticas digitais generativas, com os respectivos contornos de aplicação no setor público (SUS). A Holanda também estará presente trazendo um pouco de debate público que acontece hoje no país. Dra. Linda Kool (Coordinator Rathenau Instituut) gravou o painel “Rathenau Instituut – Holanda: Riscos, Oportunidades e o Debate Público sobre GenAI", onde aborda as várias implicações diretas e indiretas das GenAI no âmbito público.
Todavia, serão nas 10 Rodas de Debate do evento (moderador + 3 convidados nacionais) que a “cadeia nacional de saúde” vai transmitir suas mensagens. Serão mais de doze horas de conversa expondo em qual velocidade o setor público e privado estarão engajados nos próximos anos (veja todos os convidados dos debates no Programa Preliminar abaixo). Os vários temas de implicação das GenAIs serão abordados por três dúzias de especialistas, líderes e executivos do setor, descrevendo quais “fundações serão construídas” por cada player de setor. No “bug do milênio”, em 1999, previsões mostravam que “teríamos alguma IA em nível minimamente humano em 50 ou 100 anos”. Na época, a maioria dos especialistas zombou das projeções, escrevendo várias teses científicas sobre a ‘impraticabilidade de existir uma IA para rivalizar com o ser humano’. A grande maioria dos estudiosos médicos gargalhava com essa possibilidade. Pare um instante e verifique se você está ouvindo alguém rir agora.
A Microsoft (e LinkedIn) divulgou em 8/05 o “Índice de Tendências de Trabalho de 2024”, um relatório sobre o status-quo das GenIAs no Trabalho. A pesquisa, feita com 31 mil pessoas em 31 países, mostra as tendências laborais e as projeções de contratação em 2024. O resultado é um tanto óbvio para quem acompanha as tendências, mas ressalta o que vem pela frente: “2024 é o ano em que a IA no trabalho se torna real, com o uso das GenAIs quase dobrando nos últimos seis meses, ou seja, 75% dos trabalhadores globais do conhecimento já as utilizam”. Isso sinaliza que nenhum setor, segmento, indústria ou coletividade pública ou privada pretende ficar fora da “maratona GenAI” (ou sprint?).
Na Saúde, os movimentos, ensaios, testes de conceito e experimentos com as LLMs giram em torno de: aumentar a eficiência na comunicação com o paciente (medical contact center); aprimorar a personalização dos dados do paciente; expandir os processos em telessaúde; reduzir a carga administrativa (burocrática) melhorando o fluxo de trabalho nas unidades de atendimento e internação; etc. Vários desses temas serão abordados a fundo no FDHIC, salientando as oportunidades que as GenAIs oferecem à cadeia de saúde. Segundo pesquisa da Wolters Kluwer, “mais de dois terços dos médicos nos EUA mudaram de ideia, agora vendo a GenAI como benéfica à saúde”. Mais do que isso, o mesmo estudo mostra que 40% deles revelaram já estar prontos para usar GenAI em seu local de trabalho. Um ‘cavalo-de-pau’ dos prestadores de serviços médicos norte-americanos, que há um ano levantavam seus amuletos exorcizando as IAs. ‘Tarde, sempre; fora nunca’.
Ninguém no pavilhão do São Paulo Expo, imerso na Feira HOSPITALAR e sentado na sala do FDHIC 2024 vai conseguir segurar a emoção nos 4 dias do Congresso Internacional “GenAI Saúde, Brasil 2024”. Será como sentar numa nave e “visitar o porvir”. Faremos uma algazarra intelectiva com as GenAIs, uma festa celebrando um entusiasmo que a muito não se via no bioma saúde. Talvez até possamos conhecer novas startups globais, quem sabe, futuros unicórnios da infosfera sanitária. Será um prazer enorme contar com a presença de todos, desde os mais inovadores, aos mais empreendedores até alcançar os fundadores de um novo tempo. As GenAIs não vão resolver todos os problemas da Saúde, talvez não resolvam nenhum, mas devem mitigar a desesperança que inundou a Saúde pós-pandemia. De 21 a 24 de maio, o FDHIC vai “exibir o gênio fora da garrafa”, mostrando que ele não mais voltará para ela.
Guilherme S. Hummel
Scientific Coordinator Hospitalar Hub – Curador do FDHIC
Head Mentor – EMI (eHealth Mentor Institute)
Acompanhe o Programa Preliminar do FDHIC 2024: