A saúde está cara no Brasil ou o País experimenta um momento de qualificação dos serviços prestados, maior oferta de tecnologia, avanços de uma medicina de especialização e capacidade preventiva que geram, por consequência, melhoria da qualidade de vida e aumento da felicidade dos cidadãos e usuários dos serviços ora ofertados? Essa falsa dicotomia parece inquietar todos os envolvidos no setor. A queixa generalizada, a despeito dos avanços notórios claramente percebidos, está na insatisfação manifesta por prestadores de serviços, administradores de planos e seguros saúde e, naturalmente, os próprios usuários, sempre tendo como foco de descontentamento os valores cobrados pela exploração dos meios disponíveis.
O debate surge de um equívoco que pauta o uso das possibilidades oferecidas hoje no campo da medicina. Em resumo, se o bom senso começar a prevalecer, seria dirimida boa parte das dificuldades e desconfortos já apontados. Ou, em outros termos, todos os agentes envolvidos devem repensar urgentemente as formas de integração das atividades, preservando a excelência nos serviços prestados e mantendo a satisfação dos clientes, sem, com isso, comprometer a rentabilidade das respectivas operações.
Essa tarefa aparenta ser de difícil solução, mas é menos árdua do que indica a percepção geral. Da mesma forma que um hospital e os profissionais da área devem entregar o melhor serviço e resultado ao paciente, a operadora também guarda expectativa de contar com custos civilizados e justos pelas atividades desenvolvidas.
Desarmar espíritos e construir, conjuntamente, modelos operacionais ? senão consensuais, mas que sejam minimamente compatíveis ?, formam, possivelmente, a essência para uma iniciativa desta natureza ser bem-sucedida.
É fato que o paciente será exigente em contar com as melhores práticas e tecnologia disponíveis, independentemente dos custos que possam acarretar. O sentimento é o de que, em tendo um terceiro pagador para honrar as despesas, ?tudo é necessário?. Mas, não é. Nem em termos clínicos, tampouco considerando os custos administrativos e operacionais. Educar e orientar o paciente, por pressuposto desconhecedor do assunto, é uma prática elementar. Afinal, nem sempre é necessário se trabalhar pelo ?top? para atingir os objetivos pretendidos.
Exatamente por isso, os prestadores de serviços têm um papel importante a desempenhar, sobretudo no esclarecimento aos pacientes sobre as práticas a serem aplicadas, reforçando a confiança dos atendidos. Da mesma forma, as operadoras, uma vez envolvidas na conceituação do conjunto de normas e critérios a serem aplicados a cada atendimento, e respeitando os trabalhos desenvolvidos pelos provedores de serviços, também devem se imbuir deste novo espírito, cientes de que a equalização dos custos às práticas necessárias determinam o atendimento da maneira mais adequada possível.
Construir, entender, respeitar e aplicar essa lógica tende a criar um novo ambiente de negócios, mais amistoso e colaborativo. Cortar excessos deve ser um mantra repetido e aplicado incessantemente por todos os atores envolvidos neste processo. ?O extraordinário é demais?, nos ensinou Walter Disney há quase 50 anos.
Sem pieguice, é essencial que profissionais da saúde, hospitais e operadoras se enxerguem não mais como rivais, mas a mesma face de uma única moeda. A ordem é ter pragmatismo e romper tabus. Se cada agente primar por sua operação, privilegiando a eficiência e controlando custos, todos ganham, a começar por processos e eficiência operacional.
Pode até inspirar um conceito filosófico, mas esse repensar também poderá se refletir até mesmo em uma rediscussão sobre o termo ?qualidade de vida?. Discutir com o paciente o que realmente agrega valor para ele em relação aos cuidados de saúde, perguntar as suas preferências, fazer dele um maior partícipe das escolhas propostas envolvidas.
Será que o cliente, o usuário do plano ou seguro de saúde, tem conhecimento de que o simples fato de ter a melhor terapia, em especial a preventiva, não necessariamente significa ser preciso explorar o que há de mais caro e moderno no sistema? Muitas vezes, um tratamento tradicional pode gerar os mesmos resultados de uma ação que envolva pirotecnia tecnológica. E essa racionalidade também poderá se refletir nos custos de manutenção dos planos, incorrendo, em última análise, em maior competitividade do setor e melhor equalização de preços. O que terá resultados positivos para todos.
No Brasil atual, esse cliente ainda não está maduro para o debate, existe uma grande assimetria de informação e desconfiança entre os envolvidos. O primeiro passo é reduzir esta desigualdade, mostrando aos clientes a vantagem de entender melhor o funcionamento do sistema e como ele pode colaborar, com a certeza de equilíbrio em suas necessidades de saúde. Os prestadores de serviços e pagadores também deveriam se mover nesse sentido, pois o equilíbrio, sempre, é a melhor receita para solucionar as adversidades.
*Carlos Suslik, diretor de Serviços em Healthcare da PwC