Foi inadequada a exploração política – pela  situação e a oposição – do linfoma que acometeu a ministra Dilma Rousseff. Trata-se de um desrespeito à sua própria condição de paciente e cidadã, bem como aos milhares de brasileiros portadores desse tipo de câncer, o quinto mais recorrente no mundo e cuja incidência tem sido a que mais cresce a cada  ano. Além do abalo inicial provocado pelo impacto do diagnóstico, essas  pessoas são obrigadas a lidar com questões complicadas, como a internação  hospitalar, a burocracia do sistema público de saúde, as restrições  dos planos de assistência médica e a dificuldade de acesso gratuito aos medicamentos.
Assim, ao invés de indesejáveis  boatos, especulações e oportunismo de cunho eleitoral, o tema deveria inspirar  autoridades e políticos à busca de soluções efetivas, a começar pela melhor orientação dos serviços ambulatoriais no tocante ao diagnóstico precoce,  fundamental à cura. A partir da suspeita – aparecimento de gânglios,  principalmente no pescoço, por vezes associados a febre, perda de peso, suor  durante a noite e cansaço -, há exames muito eficientes, capazes de  identificar a doença mais rapidamente, possibilitando a indicação mais precisa  do tratamento para cada tipo de linfoma. Pesquisa da Associação Brasileira de  Linfoma e Leucemia (Abrale), que escutou 895 pacientes em tratamento, comprova  a necessidade de mais esclarecimentos,  pois 87,26% dos entrevistados jamais tinham ouvido falar da doença antes do  diagnóstico.
Além da adaptação exigida na rotina, trabalho e relacionamentos, o paciente com linfoma e seus familiares precisam enfrentar  enormes dificuldades, principalmente na  obtenção de medicamentos e, em  especial, a terapia dirigida ao alvo, mais moderna, que aumenta em muito as  chances de cura e apresenta menos efeitos colaterais, pois ataca apenas as  células cancerosas ou anormais. São produtos caros que, por lei – um  preceito constitucional -, devem ser fornecidos gratuitamente pela saúde pública. Porém, nem sempre estão à disposição dos doentes. Muitas vezes, até  os próprios médicos são “punidos” se prescreverem o que não está disponível  no sistema. Esses e outros medicamentos de uso continuado acabam sendo  objeto de imensa burocracia para os pacientes e seus familiares. Muitas vezes, é necessária ação judicial para a sua liberação. Aos pacientes não resta  outra alternativa, considerando o  preço e a longa duração dos  tratamentos. Por isto, é muito grave a persistência de problemas na demora da  atualização dos protocolos de tratamentos e na distribuição dos medicamentos  de alto custo. Estas questões continuam sendo a principal ameaça na vida dos pacientes. Também é  inaceitável que brasileiros continuem sendo constrangidos pela negativa de  tratamento por parte dos convênios médicos/seguros-saúde, numa impune afronta  à lei por empresas privadas que atuam nesse segmento. As mudanças da  legislação que rege a matéria não deixam quaisquer dúvidas sobre a  obrigatoriedade do pagamento. Ademais, linfoma não é hereditário. É adquirido em algum  momento da vida, em qualquer idade e sem prévio aviso. Ou seja, sua cobertura  sequer exigiria cláusula de doença preexistente nos  contratos.
Como se vê, as  dificuldades vividas pelos pacientes de linfoma e outras moléstias graves são  muito mais complexas do que supõe a retórica eleitoral. Assim, em respeito e  apoio  à mulher Dilma Rousseff e aos brasileiros que têm a doença, seria  educado e ético excluir o tema do debate relativo à sucessão presidencial.  Por outro lado, a ministra de Estado, figura pública e potencial candidata,  não deve ser poupada ou privilegiada no exercício do cargo e nos embates partidários em função do problema de saúde que enfrenta. São questões e  desafios distintos.  A abordagem do tema linfoma, de modo específico, está relacionada à política pública da saúde e quem sabe temos aí uma oportunidade para  dar mais atenção às necessidades da saúde dos brasileiros! Com  esperança, estamos todos torcendo pela boa resposta ao tratamento da ministra  Dilma e de cada um dos brasileiros que, como ela, enfrentam a doença.
*Merula Steagall é presidente da  ABRALE (Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia) e da ABRASTA (Associação  Brasileira de Talassemia).
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