A controvérsia envolvendo o governo e as operadoras de planos de saúde a respeito do ressarcimento ao SUS ainda está longe de acabar.
A instituição desta obrigação através do artigo 34 da Lei 9656/98 já foi recheada de polêmica, parcialmente solucionada com a declaração de sua legalidade pelo Supremo Tribunal Federal, através do julgamento de medida cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Confederação Nacional de Saúde ? CNS (ADIN nº 1931).
Naquela oportunidade, os argumentos da entidade representativa autora da ação foram repelidos sob fundamento de que o ressarcimento consistiria em medida de restituição pelos atendimentos prestados pelo SUS que contassem com a cobertura dos planos, evitando-se assim o ?enriquecimento sem causa das operadoras? ? como se estas não considerassem estas despesas na formação de seu preços, assumindo-as às suas inteiras expensas sem repassá-las às mensalidades arcadas pelos beneficiários, titulares do direito constitucional à saúde cujo dever compete ao próprio estado.
A despeito de divergirmos deste entendimento, guardado o devido respeito ao órgão máximo do Poder Judiciário, e restando ainda pendente de decisão a ação principal que teve origem naquela medida cautelar, bem como a aplicabilidade com relação às operadoras de natureza jurídica associativa, à autogestão e às entidades sem fins lucrativos de uma forma geral, através de processos sobrestados ainda no aguardo de julgamento, a questão central ainda continua produzindo desdobramentos, dentre os quais a prescrição trienal do ressarcimento ao SUS.
Dentre os argumentos examinados, o Supremo afastou aquele que alegava que o ressarcimento ao SUS constituiria novo tributo ou contribuição como fonte de custeio da seguridade social, o que requereria Lei Complementar para sua instituição, nos estritos termos do art. 195, § 4º, da Constituição Federal. Justificou a decisão dispondo que a característica dos pagamentos seria restituitória, consoante o voto proferido pelo Eminente Ministro Maurício Corrêa. Nesta condição, assume natureza jurídica de ordem privada, a teor do previsto no art. 884 e seguintes do Código Civil.
Partindo deste pressuposto, o prazo prescricional para cobrança do ressarcimento ao SUS é de 3 anos, de conformidade com o disposto no art. 206, § 3º, IV, do mesmo diploma, não se aplicando o prazo de 5 anos pretendido pela ANS, seja este lastreado no Código Tributário Nacional, seja pelo Decreto nº 20.910/32.
O afastamento do caráter tributário do débito torna inaplicável o prazo prescricional do CTN, ao passo em que o Decreto 20.910/32, regulamentado pelo Decreto-Lei nº 4.597/92, dispõe sobre a prescrição quinquenal da dívida PASSIVA da Administração Pública, não incidindo portanto à pretensão de direitos por parte desta contra terceiros.
Este direcionamento já conta com decisões favoráveis determinando a prescrição de cobranças efetivadas, com a consequente exclusão das operadoras do cadastro da Dívida Ativa e a decretação de inexigibilidade dos débitos correlatos.
Não obstante, a Agência Nacional de Saúde Suplementar ? ANS, detentora de competência delegada pela Lei Federal nº 9.961/2000 para exigir das operadoras o ressarcimento pelas utilizações da rede pública por parte de seus beneficiários, tem enviado inúmeras cobranças cujos atendimentos ocorreram há mais de 3 anos, ampliando sobremaneira a possibilidade de discussão da matéria.
Assim sendo, se o ressarcimento ao SUS é considerado constitucional por não depender de Lei Complementar para a sua imposição, então o respectivo prazo prescricional para cobrança não é o de 5 anos, mas sim o de 3 anos estabelecido pelo Código Civil, sobretudo diante da ausência de Lei Especial que regulamente a cobrança de dívida privada por parte da Administração Pública.
A operadora que recebeu cobranças após ultrapassados 3 anos das utilizações do SUS pode questionar judicialmente a situação, postulando a suspensão e o cancelamento das medidas com base na prescrição, observadas eventuais suspensões no intercurso do prazo durante o trâmite de recursos administrativos porventura interpostos.
*Advogado especializado em Direito da Saúde, Saúde Suplementar, Responsabilidade Civil, Direito Associativo e Empresarial. Presta atendimento a operadoras de planos de saúde. Consultor Jurídico de entidade representativa nacional de operadoras por 7 anos
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