Ferramentas como inteligência artificial (IA), big data, internet das coisas (IoT) e telemedicina ajudam a tornar os cuidados de saúde mais eficientes, personalizados e acessíveis. Além disso, a utilização estratégica de dados tem se mostrado essencial para uma gestão melhor dos recursos.
O mercado global de tecnologia da informação em saúde projeta um crescimento anual de 15% até 2025, segundo a Healthcare Information and Management Systems Society (HIMSS). Esse avanço reflete o impacto transformador das inovações tecnológicas no setor. “A tendência é de que a tecnologia no setor de saúde continue a se expandir nos próximos anos, com inovações e maior integração de soluções digitais”, analisa Luis Joaquim, sócio-líder de Life Sciences e Health Care da Deloitte.
Instituições que adotam essas tecnologias não apenas ganham competitividade, mas também estão mais preparadas para enfrentar desafios e elevar a qualidade do atendimento. Investir em inovação é, portanto, mais do que uma tendência — é uma necessidade para o futuro da saúde.
Tendências para 2025 – o que esperar
Os especialistas destacam como tendências em tecnologias para o próximo ano:
Inteligência artificial: junto com outras tecnologias, está sendo utilizada para diagnóstico, previsão de pandemias e personalização de tratamentos. Ferramentas de IA, como algoritmos de machine learning, ajudam a identificar padrões em grandes volumes de dados clínicos, permitindo diagnósticos mais rápidos e precisos. Segundo a Allied Market Research, espera-se que a IA no setor de saúde cresça a uma taxa de 41,7% ao ano.
Para 2025, Cláudio Giulliano, CEO da Folks, destaca o uso da inteligência artificial generativa, que já vem sendo utilizada em diversas frentes, como no ciclo da receita, com o objetivo de fazer leitura automática de contratos e da conta versus prontuário; no ciclo da medicação, criando um ambiente mais seguro para o paciente; no preenchimento automático dos prontuários eletrônicos; e até mesmo no marketing, para melhor se comunicar com o paciente. Um exemplo disso é o uso de chatbots.
Big data: a análise de grandes volumes de dados permite identificar padrões e tendências, ajudando na tomada de decisões clínicas e administrativas. O uso de big data em saúde está permitindo uma abordagem mais proativa na gestão de doenças e na personalização do atendimento.
Telemedicina: as plataformas de telemedicina estão se tornando cada vez mais avançadas, oferecendo uma gama diversificada de serviços, como consultas médicas, terapias e acompanhamento contínuo de pacientes. Essa tendência está em expansão e, segundo a Global Market Insights, até 2026, o mercado de telemedicina deve alcançar US$ 175,5 bilhões, refletindo o crescimento e a importância crescente dessa tecnologia no setor de saúde.
Wearables e IoT: dispositivos conectados, como smartwatches e sensores, monitoram a saúde dos pacientes em tempo real, permitindo intervenções mais rápidas e eficazes. Estes dispositivos são particularmente úteis na gestão de doenças crônicas e na promoção de estilos de vida saudáveis.
Impressão 3D: utilizada para a criação de próteses personalizadas, modelos anatômicos para planejamento cirúrgico e até mesmo na produção de medicamentos personalizados.
Metaverso: simulação da realidade, por meio de dispositivos digitais utilizados para treinamento e capacitação de profissionais, além de criação de cenários hipotéticos para desenvolvimento assistencial sem a necessidade de colocar o paciente em risco. Além do treinamento, o metaverso pode transformar a educação médica ao proporcionar experiências imersivas e interativas, o que contribuirá para enriquecer o aprendizado e preparar os profissionais para enfrentar desafios complexos no ambiente real.
5G: o uso do 5G vem despertando discussões há algum tempo na área da saúde. O principal motivo pelo qual a tecnologia desperta tanto interesse é a vantagem competitiva que oferece às empresas. Com melhorias significativas em velocidade, capacidade de dados, latência reduzida e maior densidade de dispositivos, o 5G permite a integração de inovações nas operações e ofertas das empresas.
A combinação do 5G com edge computing possibilitará serviços em tempo real, ao reduzir a latência e processar dados mais próximos da fonte. A ascensão do 5G promove também avanços nas discussões e ações relativas à segurança de dados e compatibilidade entre versões.
No âmbito da saúde, o 5G ainda está avançando lentamente, mas tem expectativa de viabilizar respostas em tempo real para, por exemplo, médicos consultarem virtualmente procedimentos cirúrgicos, busca através de drones de salvamento em desastres naturais, além de consultas por telessaúde e realização de procedimentos de ultrassom A telessaúde, alimentada pelo 5G, facilitará uma gestão mais eficaz de doenças crônicas e emergências.
Open health (inspirado no open banking): no Brasil, o prazo estipulado pela iniciativa Estratégia de Saúde Digital para o Brasil (2020-2028) para unificação dos dados é 2028, o que possibilitará que o paciente tenha um prontuário único. “Este objetivo é um grande alavancador da transformação digital. A interoperabilidade facilitará a análise de dados de desfecho, acelerando a diminuição de custos em saúde e permitindo uma maior transparência para escolha dos melhores pagadores e prestadores pelo paciente. Além disso, propiciará ações de promoção e prevenção à saúde que sejam mais compatíveis e relevantes ao comportamento e estilo de vida dos pacientes. Resultará também no fortalecimento de estratégias de saúde digital e no empoderamento do paciente”, destaca Joaquim.
Para onde estarão voltados os olhos do setor em 2025?
Em mais de um momento, gestores e executivos de saúde se deparam com uma escolha na tríade custo, acesso ou qualidade para definir seus esforços. Ou seja, parece ser impossível ter redução de custo, melhoria de acesso e garantia da qualidade ao mesmo tempo. “Porém, é o que se vê cada vez mais, e a utilização de tecnologia faz com que seja possível a tríade caminhar junta”, acredita Joaquim.
Dessa forma, segundo ele, ganhos de qualidade resultantes da redução de fraudes, garantia de acesso à assistência à saúde no momento certo para o paciente certo e ações de redução de custos através de aumentos de produtividade e eficiência operacional devem caminhar juntas em 2025, com aplicação e investimento em tecnologias como automação, uso de big data e inteligência artificial.
“Redução de fraudes podem ser aceleradas em 2025 através de torres de controle que promovem organização e sanitização de dados, possibilitando a identificação e resolução automática de abusos, fraudes e desperdícios no consumo de serviços de saúde em operadoras, avalia Fatima Pinho, sócia para a indústria de Life Sciences e Health Care da Deloitte.
Já quando o assunto é a otimização da jornada do paciente, em 2025 ela poderá vir através da análise de grandes volumes de dados, tanto provenientes de fontes públicas quanto privadas, permitindo identificar padrões e tendências e, por exemplo, contribuir para o diagnóstico mais precoce, para o acompanhamento de indicadores de monitoramento e qualidade de tratamento do paciente, além da personalização do atendimento.
Na esfera pública, Michel Fornaciali, professor e coordenador da Pós-graduação de Data Science do Insper, destaca para 2025 questões focadas em saúde populacional e na melhoria do acesso.
Integração de dados e regulação
O estudo “Batidas de esperança: avanços em cuidados cardiovasculares na América Latina”, elaborado pela Deloitte, pontuou que, para que seja possível integrar dados entre os sistemas de saúde, o principal desafio do Brasil é ter uma infraestrutura de tecnologia e um sistema que interopere dados de pacientes e os intercambie entre profissionais da área.
“A integração de dados é um problema clássico no sistema de saúde porque lidamos com diversos sistemas, alguns mais antigos, outros mais novos, que não foram pensados para ser interligados”, analisa Fornaciali.
Analisando esse tema, Giulliano acredita que falta, na saúde privada, um motivador para a interoperabilidade. “Por que um hospital deve interoperar seus dados com outro? O que ele ganha? Ele precisa ver um benefício para avançar nesse cenário. No entanto, tenho visto iniciativas de alguns grupos e operadoras que têm sido cada vez mais factíveis, mas não é a realidade. Já no sistema público, a Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS) tem avançado, e uma das iniciativas do Ministério da Saúde é facilitar o acesso aos dados pelos estados para que eles possam ser usados em estudos populacionais.”
Fatima lembra que o open health tem como um dos principais objetivos alcançar a interoperabilidade de sistemas de dados. “Da mesma forma que o open banking revolucionou a indústria de serviços financeiros, com tecnologias avançadas como o blockchain e a inteligência artificial, os dados transferíveis deverão aumentar a eficácia dos tratamentos de saúde e aperfeiçoar a investigação médica”, comenta Fatima.
Joaquim complementa dizendo que a implementação bem-sucedida e expansível do open health exigirá liderança formal, semelhante à fornecida nos serviços financeiros pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban). “É essencial estabelecer boas práticas de governança, assegurar a segurança e privacidade dos dados, bem como promover a confiança entre as partes interessadas.”
Em relação à regulamentação do uso dessas tecnologias, em especial a aplicação da inteligência artificial, atualmente o assunto se encontra em debate no Senado Federal, por meio do PL nº 2.338/2023, que consolidou outros projetos de lei sobre o tema e estabelece normas gerais de caráter nacional para a concepção, desenvolvimento, implantação e utilização responsável de sistemas de IA.
“O desafio da regulação da IA está em coibir excessos, mas sem podar a inovação. A regulação tem que proteger o paciente para que ele não seja alvo da inteligência artificial que não foi testada”, analisa o CEO da Folks.
Um ponto positivo que Fornaciali destaca é que ele tem observado um debate sobre o uso ético de soluções tecnológicas, como a IA, que visa não excluir pessoas ou propagar informações enviesadas. “Quem lida com dados precisa ter a preocupação com vieses que a base pode ter. Só assim poderemos evitar o acesso de poucos a uma saúde de mais qualidade.”
Para isso, analisa o coordenador do Insper, é essencial investir no letramento das pessoas, capacitando-as em relação a como o dado deve ser gerado, analisado e incorporado em soluções que contribuam para a tomada de decisão cotidiana.
Próximos passos da jornada tecnológica
“De uma forma geral, vemos que o próximo passo para avanços na saúde, que incluem a jornada tecnológica, está na abertura da conversa e atuação dos diversos atores de saúde em ecossistema. Desafios cada vez mais complexos requerem ações mais complexas e integradas”, aponta Fatima.
Diante desse cenário, tornam-se necessários, diz ela, a equidade no letramento digital dos atores, seguida da colaboração como cadeia de valor em saúde, com parcerias em diferentes esferas (público-público, privada-privada e público-privada) no ecossistema de saúde, abrindo o potencial para compartilhar custos, aproveitar conhecimentos diversos, adaptar soluções de forma eficiente e expandi-las para alcançar um impacto mais abrangente.
“Este modelo colaborativo aumenta a produtividade, beneficia pacientes e profissionais de saúde, exercendo um impacto substancial na sociedade como um todo”, pondera Joaquim.
Vislumbrando um cenário de futuro, Giulliano lembra que os próximos passos da jornada tecnológica não devem estar limitados à incorporação tecnológica, e pontua que falta governança. “Adotamos tecnologias, mas nos esquecemos de organizar a estrutura de governança e de equipes que ofereçam o suporte necessário para a inovação.”
Ele comenta sobre o estudo realizado pela Folks, chamado “Mapa da transformação digital do hospital brasileiro 2024”, que aponta que, entre os 189 hospitais avaliados, o índice de maturidade digital está em 46,19%. “No entanto, quando avaliamos o subdomínio estrutura e governança, apenas 14% deles possuem o que chamamos de maturidade digital governada, ou seja, possuem comitês de saúde digital e engajam seus profissionais nessa jornada, entre outros tópicos.”
Segundo Giulliano, essas instituições constroem soluções que não vão atender à real necessidade do hospital, das operadoras e da medicina diagnóstica. Outro ponto levantado pela pesquisa diz respeito à competência digital, ou seja, o quanto as instituições investem na formação de uma cultura digital. Só 11% delas possuem estratégia de treinamento focado no aumento do conhecimento digital na saúde.
“Falta estabelecer um plano para a transformação digital; falta competência digital e um ambiente full paperless real. Falta, ainda, garantir a proteção dos dados do paciente e da instituição”, finaliza Giulliano.